Quem mais precisa de políticas públicas para manter o tratamento contra doenças crônicas, como hipertensão, diabetes e asma, pode ter mais dificuldade para encontrar medicamentos das Farmácias Populares em 2023. Caso o corte orçamentário federal de 60% seja executado, pelo menos 520 farmácias do tipo serão afetadas no Ceará.
Isso porque o Governo
Federal enviou um projeto para o Congresso Nacional em que estabelece o
investimento de R$ 841 milhões para a distribuição de medicamentos gratuitos
pelas farmácias populares do País no próximo ano. Esse valor é 58,7% menor do
que o recurso de 2022, que é de R$ 2,04 bilhões.
Além disso, as Farmácias
Populares disponibilizam remédios e fraldas geriátricas com valor abaixo do
mercado devido ao sistema de co-pagamento, que é quando o governo paga boa
parte do produto. Este ano, foram cerca de R$ 445 milhões investidos e 2023
deve ter R$ 176 milhões, conforme a proposta, com redução de 60%. Não há
estimativa para o impacto financeiro por Estado.
Mas, para ter uma
dimensão da realidade cearense: as farmácias populares estão em 146 cidades e
490.611 pessoas foram beneficiadas em 2021, conforme o Ministério da Saúde (MS)
informou ao Diário do Nordeste em maio deste ano.
A possibilidade de
cortar recursos das farmácias populares pode gerar impacto significativo no
acesso de 13 remédios ofertados de forma gratuita à população, além da
sobrecarga do sistema de saúde, como alertou a Associação Brasileira das
Indústrias de Medicamentos Genéricos e Biossimilares (PróGenéricos).
MEDICAMENTOS GRATUITOS
OFERTADOS PELA FARMÁCIAS POPULARES
“Isso é uma perda muito
grande, porque os recursos que nós temos para a programação de medicamentos da
atenção básica são finitos, a gente não consegue atingir todas pessoas que
precisam”, analisa Sayonara Cidade, presidente do Conselho das Secretarias
Municipais de Saúde do Ceará (Cosems-CE).
Procurado sobre o corte
orçamentário, o MS não respondeu até a publicação desta reportagem. O
Ministério da Economia, buscado sobre a justificativa para a redução da verba
das farmácias populares e quais medidas devem ser implementadas para atender a
população, respondeu apenas que “não irá se manifestar”.
Além dos remédios
gratuitos, as Farmácias Populares comercializam produtos com valor abaixo da
média numa lógica de co-pagamento, em que o Governo Federal arca com parte dos
custos. São 10 princípios ativos, além de fraldas geriátricas.
MEDICAMENTOS DE
CO-PAGAMENTO OFERTADOS PELA FARMÁCIAS POPULARES
Com menos recurso,
haverá menos remédios a baixo custo disponíveis para a população. Isso tem
impacto direto na saúde pública, como destaca a presidente da PróGenéricos,
Telma Salles.
“Reduzir verba do
programa Farmácia Popular trará prejuízos imensuráveis para todo o sistema de
saúde brasileiro. Estamos falando da vida das pessoas. Será oportuno saber como
o governo pretende tratar as pessoas que ficarão sem esses medicamentos”,
aponta.
Isso pode acontecer num
contexto em que o Ceará depende do apoio das Farmácias Populares para atender a
demanda, como avalia Sayonara Cidade.
“A farmácia básica não é
suficiente para todas as pessoas, então precisamos melhorar esse recurso,
porque o valor está muito aquém do que precisa para comprar medicamento para a
população. Ainda mais com o aumento desses medicamentos por conta da pandemia”,
frisa.
CONSEQUÊNCIA DIRETA
ENTRE CEARENSES
Famílias em situação de
vulnerabilidade são as mais afetadas com a possibilidade de redução na verba
repassada para as Farmácias Populares. Se isso acontecer, inclusive, agrava o
problema em que as farmácias das unidades de saúde não são suficientes.
Essa é a análise da
presidente do Cosems Sayonara Cidade, que ressalta a seriedade da decisão. “É
uma tristeza ver o Governo Federal escolher (cortar) logo num insumo importante
e precioso para a vida das pessoas, que é o medicamento”, completa.
As consequências disso
são as pessoas complicando a situação de saúde e precisando cada vez mais dos
hospitais. Quando você deixa de fazer uso da medicação para o paciente
asmático, hipertenso ou diabético, o que a gente vai ter são infartos, AVCs e
pessoas morrendo por DPOC (doença pulmonar)
SAYONARA CIDADE
Presidente do Cosems
Com mais pacientes
vulneráveis às formas graves das doenças, as emergências, por exemplo, podem
receber mais pessoas. “A consequência é o agravamento desses pacientes
complicando e precisando cada vez mais do hospital, encarecendo mais ainda a saúde”,
completa.
Quem observa esse
aumento dos preços com preocupação é o recepcionista Joel James, que ajuda nos
cuidados da tia com deficiência. Entre remédios para regular a pressão arterial
e as medicações psiquiátricas, o total de R$ 800 passou para R$ 1.000 mensais
em pouco tempo.
“São várias medicações,
algumas nós compramos pelo valor total e o resto a gente pega na farmácia
popular. A gente não sabe como vai ser no futuro se esse corte for realmente
feito”, destaca. Atualmente, Joel consegue buscar metformina e losarta entre os
comprimidos distribuidos gratuitamente.
“A farmácia popular nos
ajuda muito financeiramente, porque minha tia recebe muitas medicações. Como
tem um custo muito alto, vai aumentar bastante o dinheiro gasto”, reforça.
“INTERESSE NA
DESCONTINUIDADE”
O Programa Farmácia
Popular do Brasil foi criado em 2004 com o objetivo de oferecer à população o
acesso a medicamentos considerados essenciais, cumprindo uma das principais
diretrizes da Política Nacional de Assistência Farmacêutica.
Farmácias da iniciativa
privada, por exemplo, podem se credenciar para disponibilizar medicamentos pelo
Programa. Isso é uma estratégia para alcançar mais pessoas nos municípios
brasileiros.
Para isso, há uma série
de exigências para o cadastro das empresas, além de um protocolo para garantir
que os remédios sejam distribuídos de forma adequada. No entanto, o PFPB sofre
com a falta de investimentos.
Nos últimos 3 anos é
como se houvesse interesse da descontinuidade do Programa e aquilo que deveria
estar aumentar está diminuindo. Com essa notícia do corte de 60% isso vem ferir
os anseios da população carente
FÁBIO TIMBÓ
Assessor jurídico e
presidente executivo do Sincofarma
Fábio Timbó ressalta a
expectativa de que o projeto seja rejeitado para a continuidade da
disponibilidade dos medicamentos. “Se isso for aprovado, alguns
estabelecimentos não terão interesse de continuar cadastrados no Programa”,
conclui.
Foto: Fabiane de Paula /
Fonte: Diário do Nordeste
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