Em carta enviada nesta sexta-feira (25) aos ministros do Supremo Tribunal Federal, setoriais afros de seis partidos políticos sugerem aos ministros da corte a adoção de regulamentação da cota racial eleitoral com o objetivo de evitar fraudes e um possível efeito reverso de dificultar a participação de negros na política.
Setores afros de seis partidos sugeriram regulamentação da mudança, para não ocorrer risco de 'laranjas' repassando recursos para outros candidatos.
Ao todo, 21 mil candidatos já apresentaram registro de cor diferente do usando nas eleições de 2016. | Agência Brasil.
Entre as três medidas
objetivas sugeridas pelos núcleos afros de Cidadania, PSDB, PDT, PSB, MDB e DEM
está a de que haja fiscalização e rejeição da mudança de autodeclaração da cor
por parte de candidatos em relação ao que informaram nos últimos pleitos.
"Pensamos que
outro meio de coibir atos fraudulentos é a checagem da declaração de campanhas
anteriores daqueles que já disputaram cargos eletivos, tendo estes que manter a
declaração das campanhas passadas", diz o documento, afirmando ainda
vislumbrarem "o perigo de candidaturas 'laranjas' onde negros sirvam de
repassadores de recursos como ocorreu com a cota de 30% das mulheres em algumas
situações."
Além das candidaturas
fictícias -no caso das mulheres, reveladas pelo jornal Folha de S.Paulo em
várias reportagens em 2019-, outro receio de fraude da cota eleitoral para
negros é a de que haja autodeclarações falsas com o objetivo de obter as
verbas.
Assim como no
recenseamento da população feita pelo IBGE, desde 2014 os candidatos devem
declarar a cor ou raça com base em cinco identificações: preta, parda (que
formam a população negra do país), branca, amarela ou indígena.
A Folha de S.Paulo
mostrou nesta sexta-feira (24) que ao menos 21 mil candidatos de todo o país
que disputarão as eleições deste ano mudaram a declaração de cor e raça que
deram em 2016, conforme registros disponibilizados até a quinta-feira (23) pela
Justiça Eleitoral.
A maior parte das
mudanças -36% do total- foi da cor branca para parda. O movimento contrário vem
na sequência, com 30% das alterações de pardo para branco.
Apesar da
possibilidade de fraude, especialistas falam no impacto do aumento de pessoas
que se reconhecem como pretas e pardas após ações de combate ao racismo.
Em decisão liminar
que deve ser analisada nos próximos dias pelo plenário do Supremo Tribunal
Federal, o ministro Ricardo Lewandowski determinou que os partidos distribuam
já em 2020 a verba pública de campanha e o espaço da propaganda eleitoral de
forma proporcional aos candidatos brancos e negros.
"Entendemos que
as estruturas partidárias em âmbito federal, estadual e municipal são brancas
em seus espaços de decisão, tendo na base desta estrutura a massa negra que
soma mais de 54% da nossa nação. Esta massa, agora, dá um passo gigantesco para
que possamos ser representados de fato nos espaços de poder público eletivo.
Porém, um passo gigantesco na direção errada pode ser fatal, e para além das
benesses que firmaram até o momento as distintas cortes, entendemos os perigos
que a nova jurisprudência traz consigo", afirma o documento dos setoriais
afros das siglas.
A posição favorável à
adoção imediata das cotas se choca com a das cúpulas partidárias dessas
próprias siglas, que em reunião nesta semana com o presidente do TSE (Tribunal
Superior Eleitoral), Luís Roberto Barroso, chegaram a dizer ser inexequível o
cumprimento da medida ainda neste ano.
Os núcleos afros dos
partidos sugeriram aos ministros também a adoção de fiscalização da cor
declarada pelos candidatos com base nas características físicas das pessoas e
não em suposta ascendência negra.
"Trazemos ainda
como referencia entendimento firmado pelo STF na ADPF 186 sobre a
constitucionalidade da fixação de cotas raciais para o ingresso de estudantes
em universidades públicas, donde se viu a necessidade da implantação de
comissões de heteroidentificação, diminuindo assim drasticamente o número de
fraudes nas universidades e concursos, o que sugerimos que seja nos moldes da
portaria conjunta nº 04/2018 do Ministério do Planejamento que instituiu
Comissões em Concursos Públicos Federais para avaliar os fenótipos dos
candidatos para combater as fraudes."
Afirmando ainda que a
medida pode levar alguns partidos a diminuir o recrutamento de candidatos
negros, os núcleos afros pedem que o STF estabeleça também cota de candidatos
por partidos, não só cota financeira proporcional aos candidatos lançados.
"Entendemos que
a proporcionalidade de recursos pode ser fator impeditivo na constituição de
nominatas justas. Sabendo da política como ela é, entendemos que alguns
partidos podem vetar candidaturas negras em função da divisão do recurso.
Propomos, portanto, um percentual mínimo de candidaturas negras em cada
partido, essas a serem definidas por obvio em suas nominatas", diz o
documento.
Que prossegue:
"Confiantes e ladeados pelo órgão máximo da justiça brasileira, bem como
do Tribunal Superior Eleitoral estaremos atentos às fraudes. Não deixaremos que
usem nossa pauta, nossas vidas e nossas lutas com a finalidade de burlar ou se
aproveitar do novo instrumento jurídico em tela."
O texto é assinado
pelo Setorial Cidadania - Igualdade 23, Tucanafro (PSDB), Secretaria nacional
PDT afro, Negritude Socialista Brasileira (PSB), MDB Afro e o setorial do DEM.
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