Cláudia Helena Acosta Rodrigues da Silva, chefe da central de vacinação de Duque de Caxias (RJ), disse em depoimento à Polícia Federal ter emprestado sua senha para o secretário de Governo do município apagar os registros de vacinação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A informação foi dada à Polícia Federal, que investiga suposta fraude no registro de vacinação do ex-presidente Jair Bolsonaro.
A operação Venire, da PF, foi deflagrada no último dia 3 de maio | ( Marcelo Camargo/ Agência Brasil)
PF suspeita de desvio de dinheiro no governo Bolsonaro
Ela
afirmou aos investigadores da suposta
fraude no sistema de vacinação ter sido procurada pelo secretário
João Brecha na data da exclusão, mas relatou não ter recebido os CPFs dos
excluídos sob a justificativa de não "envolvê-la em problemas, uma vez que
se tratavam de pessoas relevantes e conhecidas".
Cláudia foi
um dos alvos no último dia 3 de maio da operação Venire, que fez busca na
residência de Bolsonaro e prendeu alguns de seus principais assessores, como o
tenente-coronel Mauro Cid, ex-chefe da Ajudância de Ordens da Presidência da
República.
Ao falar do
motivo do empréstimo da senha pessoal do sistema de vacinação, ela justificou
não ter visto "qualquer má fé" no pedido do secretário e disse ter
acreditado que as exclusões seriam "idôneas".
As exclusões
foram registradas em 27 de dezembro pelo usuário em nome de Cláudia Rodrigues e
estão entre as informações levantadas pela PF na investigação de fraude ao
sistema do Ministério da Saúde para emissão do certificado de vacinação de
Covid a ser utilizado na viagem para os Estados Unidos por Bolsonaro e seus
assessores.
Cláudia foi
procurada, mas não retornou o contato. A Prefeitura de Duque de Caxias informou
que, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, instaurou uma sindicância no
último dia 4 para apurar os fatos e responsabilidades acerca das circunstâncias
supostamente ocorridas no âmbito municipal.
De acordo com
a investigação da PF, foi inserido no sistema como se Bolsonaro tivesse tomado
duas doses de vacina contra Covid, a primeira em 13 de agosto e a segunda em 14
de outubro.
A inserção
desse registro retroativo de vacinação na rede do Ministério da Saúde, porém,
só ocorreu em 21 de dezembro, pouco antes de o então presidente viajar para os
EUA.
No dia
seguinte, em 22 de dezembro, o certificado de vacinação de Bolsonaro foi
emitido de dentro do Palácio do Planalto.
Dias depois,
em 27 de dezembro, novamente houve uma emissão de certificado e, em seguida, o
usuário em nome da chefe de vacinação de Duque de Caxias apagou o registro do
sistema com a justificativa de "erro".
Para a PF, a
"coerência lógica e temporal desde a inserção dos dados falsos" até a
geração dos certificados indicam que Bolsonaro e Mauro Cid, seu ajudante de
ordens, "tinham plena ciência da inserção fraudulenta dos dados de
vacinação".
Embora no
registro no sistema de vacinação conste que a exclusão das vacinas atreladas a
Bolsonaro se deu por erro, a PF afirma no pedido de busca contra Bolsonaro que
isso foi feito para "dificultar a identificação do proveito do crime de
inserção dos dados falsos no sistema".
A chefe de
vacinação do município fluminense também foi questionada pelos investigadores
sobre a inserção das vacinas em nome de Bolsonaro no sistema.
No inquérito
da PF, os registros de inserções estão em nome do próprio secretário de
Governo, João Brecha. Cláudia Rodrigues disse desconhecer os fatos e afirmou
não ter contato com políticos.
Em relação às
inserções de registros de vacinação para Mauro Cid e seus familiares, ela
afirmou não ter informações da presença deles na cidade e de como as inclusões
foram feitas.
Outro tema
abordado pela PF foi sua relação com o secretário João Brecha. Cláudia disse
não conhecê-lo pessoalmente e que o pedido para ajudá-lo com o acesso ao
sistema de vacinação foi feito por sua chefe, a secretária de Saúde, Célia
Serrano.
Só após a
solicitação de sua superior, disse ela, os dois começaram a se falar pelo
WhatsApp.
Na
representação em que pediu as buscas contra Bolsonaro, a PF detalha minuto a
minuto como foram as alterações no sistema e a emissão do cartão de vacinação
em nome do ex-presidente.
As inserções,
emissão dos certificados e posterior exclusão dos registros, para a PF,
configuram a existência de crime.
"Tais
condutas, contextualizadas com os elementos informativos apresentados, indicam
que as inserções falsas podem ter sido realizadas com o objetivo de gerar
vantagem indevida para o ex-presidente da República Jair Bolsonaro relacionada
a fatos e situações que necessitem de comprovante de vacinação contra a
Covid-19", diz a PF.
A
Procuradoria-Geral da República foi contra as buscas solicitadas pela PF e
afirmou que Mauro Cid "teria arquitetado e capitaneado toda a ação
criminosa" à revelia do ex-presidente.
"Não há
lastro indiciário mínimo para sustentar o envolvimento do ex-presidente da República
Jair Bolsonaro com os atos executórios de inserção de dados falsos referentes à
vacinação nos sistemas do Ministério da Saúde e com o possível uso de
documentos ideologicamente falsos", diz manifestação assinada por Lindôra
Araújo.
Moraes
discordou da PGR sobre a tese de que Cid atuou sozinho e concedeu as buscas.
"Não há
qualquer indicação nos autos que conceda credibilidade à versão de que o
ajudante de ordens do ex-presidente da República Jair Bolsonaro pudesse ter
comandado relevante operação criminosa, destinada diretamente ao então
mandatário e sua filha L. F. B., sem, no mínimo, conhecimento e aquiescência
daquele, circunstância que somente poderá ser apurada mediante a realização da
medida de busca e apreensão requerida pela autoridade policial", afirmou o
ministro.
Veja o minuto a minuto da suposta fraude no registro
de vacinação de Bolsonaro:
21/12/2022 às
19h
O secretário
de Governo de Duque de Caxias, João Carlos Brecha, inseriu os dados falsos de
vacinação contra a Covid-19 em nome do ex-presidente Jair Bolsonaro
22/12/2022 às
07h59
O usuário
associado ao ex-presidente, utilizando o endereço de IP cadastrado no Palácio
do Planalto, acessou o aplicativo ConecteSUS
22/12/2022 às
8h
O usuário
emite o certificado de vacinação contra a Covid-19 contendo o registro de três
doses de vacina, sendo duas da fabricante Pfizer, tomadas no município de Duque
de Caxias
22/12/2022 às
8h20
Ocorre a
alteração cadastral no "Gov.br" do então presidente, passando a ter o
email de Marcelo Câmara, nomeado assessor para acompanhar Jair Bolsonaro, na
condição de ex-presidente da República
27/12/2022 às
14h19
O usuário do
ex-presidente da República, utilizando o endereço de IP cadastrado no Palácio
do Planalto, acessou o aplicativo ConecteSUS
27/12/2022 às
14h19min44seg
Usuário
emitiu novamente o certificado de vacinação contra a Covid-19 contendo o
registro das mesmas vacinas
27/12/2022 às
20h59
Após a
geração desse segundo certificado, os registros das vacinas da fabricante
Pfizer em nome de Bolsonaro foram excluídos do sistema do Ministério da Saúde
Segundo a PF,
quem apagou os registros foram a operadora Claudia Acosta da Silva, sob a
justificativa de 'erro'
30/12/2022 às
12h02
O usuário
associado ao ex-presidente usou endereço de IP vinculado ao terminal telefônico
em nome de Mauro Cid para acessar o aplicativo ConecteSUS
30/12/2022 às
12h02min24seg
O usuário
atrelado a Bolsonaro emitiu um novo certificado de vacinação contra a Covid19,
agora contendo apenas o registro da vacina da fabricante Janssen, pois as
demais já haviam sido excluídas.
Por volta das
14h
Cerca de duas
horas após a emissão do certificado, Mauro Cid e Jair Bolsonaro viajaram de
Brasília para a cidade de Orlando, nos Estados Unidos. O voo da Força Aérea
brasileira decolou por volta das 14h.
Autor:FABIO
SERAPIÃO/FOLHAPRESS
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