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Funcionária afirma ter sido demitida de franquia de empresa cearense após não declarar voto em Bolsonaro.

A consultora comercial Tainara Moura, 26 anos, afirma que foi demitida de um núcleo no Espírito Santo da empresa de coaching Febracis, com matriz em Fortaleza (CE), por assédio eleitoral — ela declarou não apoiar o presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) e foi taxada como se estivesse ao "lado do diabo".

Foto: Instagram/Reprodução

"Tô me sentindo lesada porque eu tinha muita paixão mesmo. Eu postava no meu Instagram  participando das coisas da empresa, atingia as metas, trabalhei em todas as palestras à noite, às vezes ficava até mais tarde para assistir e estudar, e sou uma funcionária que eles não têm o que reclamar. Não existe outro motivo para isso." 

A assessoria jurídica da Febracis no Ceará informou que desconhece o fato, já que a empresa onde teria ocorrido o caso é uma franquia independente, com administração própria. Disse ainda que preza "pela liberdade de orientação política e demais formas de expressão". 

Após a demissão, a ex-funcionária publicou um desabafo no perfil dela no Instagram. Na postagem, ela disse estar muito tranquila e de consciência limpa, dado que não fez nada de errado.

"O meu erro ali, ao ver deles, é escolher o diabo, porque eles falaram que esta eleição é espiritual, uma batalha espiritual, entre Deus e o diabo. Bolsonaro está do lado de Deus, e o Lula, do lado do diabo. E como eu me posicionei contra o Bolsonaro, eles automaticamente deduziram que me posicionei a favor do Lula", falou na gravação. 

Na empresa desde julho deste ano, Tainara trabalhava na filial do Espírito Santo, promovendo vendas por telefone e presencialmente, em dias de cursos promovidos pela instituição. A rotina de trabalho contava, também, com atividades matinais, como uma oração e um exercício de ativação de recurso — ação da área de coaching —, mas passou a incorporar outras atividades, como a de escutar discursos com teor politizado. 

Segundo a ex-funcionária, a empresa passou a pontuar, "de forma leve", posicionamentos políticos desde a campanha pelo primeiro turno no núcleo dela. "Ela falava do posicionamento dela, mas não tava impondo que os funcionários votassem no Bolsonaro", relatou. 

Nesse ínterim, a diretora da instituição, Karla Frazão, discursava ressaltando posicionamentos da empresa na sala de trabalho, na qual setores como financeiro, comercial e administrativo trabalham em conjunto, apontou a ex-funcionária. Além disso, a Febracis enviava informativos com links para lives do Bolsonaro, pedindo participação dos colaboradores. 

No entanto, segundo ela, no segundo turno, a promoção de Bolsonaro "começou a se intensificar", inclusive em reuniões com os trabalhadores. "Ela [a empresa] começou a exigir um posicionamento dos funcionários, foi empurrando o posicionamento político deles", afirmou, dizendo, ainda, que passou a sentir mais pressão nesta semana. 

"Ela [a diretora da empresa] falou que quem não se posicionou ou está em dúvida, já escolheu um lado." 

Ainda segundo a consultora de vendas, a diretora apontou que a empresa fecharia caso o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ganhasse. Na ocasião, Tainara questionou o assunto, apontando que a Febracis já existia no governo petista, e a diretora a mandou estudar a história da companhia. 

Isenção

Dadas as ações de teor político adotadas pela instituição internamente, Tainara preferiu se manter reservada quanto à sua posição ao longo do tempo. 

"Não me posicionei porque eu não queria falar de política dentro da empresa, e durante todo esse tempo me mantive calada, porque eu amava meu trabalho, meu propósito na empresa", disse. 

"Sempre sorria, as pessoas ao redor sabiam, me viam postando sobre a empresa no Instagram. Sempre bati metas, não chegava atrasada, todos os funcionários que trabalham lá viam", salientou, dizendo que, apesar disso, o ambiente passou a ficar distinto. 

"Este mês, com tudo isso acontecendo, todo mundo começou a ficar num clima meio ruim", relatou, dizendo que, na segunda-feira (24), começaram a vazar conversas de supervisores da empresa indicando que haveria demissão em que não votasse em Jair Bolsonaro. 

Além de Tainara, outras três pessoas foram demitidas da empresa nesta semana, apontou a ex-funcionária. "E eu nem me posicionei a favor do Lula", ressaltou dizendo que, no primeiro turno, não votou em nenhum dos dois candidatos e que, no domingo (30), justificará o voto. 

Denúncias

Após o ocorrido, a ex-funcionária fez uma denúncia no Ministério Público do Trabalho (MPT), no aplicativo Pardal, da Justiça Eleitoral, e entrou em contato com um advogado para tomar outras providências. 

Além disso, ela publicou um vídeo de um minuto e 11 segundos desabafando sobre o assunto em rede social, dado que "sentiu necessidade" por todo mundo conhecer a postura dela no trabalho. 

Com a repercussão do vídeo, que acumulava quase 2,7 mil curtidas até a manhã desta quinta-feira (27), Tainara disse ter recebido não somente apoio, mas também relatos de histórias parecidas em outras unidades da empresa. 

"Vários ex-funcionários comentaram na minha publicação o que sofreram também. Meu direct [caixa de entrada do Instagram] também tem muita mensagem de pessoas que sofreram com isso", relatou ao g1. 

Franquia diferente

A assessoria jurídica da Febracis no Ceará informou que atua com várias franquias no Brasil e que a empresa onde o fato teria ocorrido é dissociada e independente da administração. Disse ainda que não identificou a pessoa que acusou a empresa no quadro de colaboradores, podendo tratar-se de uma funcionária de outra empresa da franquia, com administração independente. 

"Não obstante, considerando o respeito e a liberdade de expressão que prezamos a todos e que deve ser replicado pelas Franquias, não acreditamos ter ocorrido o suposto assédio eleitoral", afirma a Febracis.

Entretanto, a Febracis informou ainda que está em processo de notificação extrajudicial junto à unidade franqueada para que possa entender o caso e adotar as providências cabíveis.

Além disso, o g1 também buscou a diretora da Febracis no Espírito Santo, Karla Frazão, sobre o caso. Até a última atualização desta matéria, a diretora não enviou resposta.

Fundada no Ceará em 1998, a empresa inicialmente se chamava Instituto Paulo Vieira, mas mudou de nome em 2009. A companhia tem matriz em Fortaleza e São Paulo e núcleos em mais de 40 cidades do país, além de Estados Unidos, América, África e Europa, conforme site institucional. 

De acordo com o site, a atuação da empresa é "destaque no mercado por transformar vidas através do coaching integral sistêmico". Tal método é atribuído a Paulo Vieira, fundador do instituto e dito como "um dos mais conceituados coaches do Brasil". 

O Ministério Público do Trabalho no Espírito Santo (MPT-ES) informou, em nota, ter autuado a notícia de fato na manhã desta quinta-feira (27), a partir das informações recebidas por meio da imprensa. 

O órgão comunicou estar adotando expedição de recomendação aos empregadores ao receber denúncias relacionadas a assédio eleitoral. Após o andamento das investigações, a instituição pode decidir pela celebração de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) ou pelo ajuizamento de eventual Ação Civil Pública (ACP) visando a "reparação do dano imensurável causado pelo empregador e sua conduta". 

Além dessa, não foi localizada nenhuma outra denúncia contra a Febracis no sistema de pesquisa do MPT-ES, acrescentou o órgão. No estado capixaba, foram registradas 35 denúncias de assédio eleitoral, com 21 empresas denunciadas. 

Assédio eleitoral

O assédio eleitoral é caracterizado quando o funcionário, estando em ambiente de trabalho ou situações relacionadas, é intimidado, ameaçado, humilhado ou constrangido por um empregador ou colega de trabalho com objetivos de influenciar ou manipular o voto, manifestação, apoio ou orientação política. 

Além disso, a prática de promessas de benefícios para que funcionários deixem de votar em determinadas pessoas também é indicada como assédio eleitoral. A prática é considerada crime pelo Código Eleitoral, dado que fere o direito à livre escolha do eleitor, e também configura irregularidade trabalhista, caso praticada por patrões contra empregados. 

Tais situações podem atingir um público diverso dentro de uma empresa, como aprendizes, estagiários, terceirizados, candidatos a emprego, voluntários, fornecedores, entre outros.

Conforme os artigos 300 e 301 do Código Eleitoral, a pena prevista para o crime é de até quatro anos de prisão, além de multa, mesmo que o objetivo do assédio eleitoral não seja atingido. A prática também pode configurar irregularidade trabalhista, podendo resultar no pagamento de dano moral individual ao trabalhador e coletivo, pelos prejuízos causados à sociedade.

Se houver comprovação que o ilícito beneficiou determinado partido ou candidato, a prática também pode ser considerada abuso de poder econômico, levando, inclusive, à cassação. 

 

G1 CE

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