A campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai concentrar ataques ao ministro da Economia, Paulo Guedes, na tentativa de enfraquecer o debate em torno das pautas de costumes e levá-lo para a trincheira do social, o que imaginam favorecer o presidenciável petista, segundo aliados dele. A polêmica sobre desvincular o salário mínimo da inflação — que levou o governo e Bolsonaro a atuarem para reduzir danos — foi comemorada pelos petistas, já que o aumento real do mínimo é uma das principais propostas de Lula.
Bolsonaristas afirmam que titular da Economia fez ‘lambança’ e presidente e vice tentam conter danos.
Paulo Guedes e Lula Foto:Pablo Jacob/Ag. O Globo e Divulgação/PT |
— É
irresponsabilidade do ministro Guedes falar uma coisa dessa. Eles acham que os
aposentados, os pensionistas e as pessoas que recebem o BPC são um peso, um
fardo — disse Lula em uma transmissão nas redes sociais já na noite desta
sexta-feira, quando prometeu não apenas a correção pela inflação, como aumento
real: — No nosso governo o salário mínimo vai crescer o mesmo que a economia.
Se a economia crescer 10%, ele vai ter 10%. Se crescer 2%, vai ter 2%.
Internamente,
o QG lulista admite que não tem conseguido pautar a disputa no segundo turno e
tem sido dragado pelos embates sobre valores e religião, arena em que o
presidente Jair Bolsonaro (PL) se sente mais confortável. Mas agora um dos
alvos do PT será a proposta de desvincular o reajuste de salário mínimo e
aposentadorias da inflação do ano anterior, cogitada por Guedes.
Após
repercussão negativa, o ministro disse que garantirá um aumento acima do índice
de preços do ano anterior. O presidente Bolsonaro também gravou um vídeo com a
promessa, embora não existam recursos no
orçamento de 2023 para isso. O atual chefe do Executivo nunca propôs, em
seu governo, reajustes acima da inflação para o salário mínimo. A campanha de
Lula, assim, vai enfatizar que o responsável pelo caixa do governo flerta com
medidas que vão reduzir o poder de compra dos mais pobres.
O deputado
federal André Janones (Avante-MG) foi escalado para a missão de fazer barulho
nas redes sobre o assunto. Na manhã desta sexta-feira, tentou emplacar um
tuitaço com a mensagem “Bolsonaro não mexa no meu salário”. Na noite deste
sábado, Lula fará uma live com o parlamentar no Facebook, rede social que
concentra o público que a campanha deseja atingir com essa discussão. A
conversa irá focar em Guedes, beneficiários do Auxílio Brasil e propostas para
economia.
A estratégia é
reforçar a ideia de que Bolsonaro não gosta de pobre e é “desumano”, buscando
conter o avanço do atual presidente nesta faixa do eleitorado. Outras peças
publicitárias com essa mensagem estão sendo elaboradas para o horário eleitoral
gratuito. Pesquisa Datafolha divulgada na quarta-feira mostrou que, entre os
beneficiários do Auxílio Brasil, Lula saiu de 62% para 56% em intervalo de
apenas cinco dias. No mesmo período, Bolsonaro subiu de 33% para 40%.
Com a
iniciativa, o PT pretende alterar o eixo do debate. Desde a largada do segundo
turno, Lula já abordou temas como canibalismo, maçonaria e pedofilia. Gravou
vídeo em que se disse pessoalmente contrário ao aborto e, após aliados vencerem
sua resistência, assinou uma carta com compromissos aos evangélicos, divulgada
na quarta-feira. Nessa esteira, o ex-presidente tem enfatizado a importância da
família e, nesta semana, chegou a falar contra a implementação de banheiro
unissex nas escolas. As redes bolsonarista batem há meses na ideia de que o PT
defende banheiros únicos para meninos e meninas, o que não está entre as
propostas do partido.
— Tem coisa que eu não acredito que o ser
humano possa acreditar. Mas eles falam, e tem gente que acredita. Agora
inventaram a história do banheiro unissex. Gente, eu tenho família, eu tenho
filho, eu tenho neta e bisnetas. Só pode ter saído da cabeça de Satanás a
história do banheiro unissex — disse Lula na quarta.
Embora Bolsonaro tenha sofrido um forte
desgaste com o episódio do encontro com venezuelanas, aliados do presidenciável
do PT reconhecem que esse não é um cenário confortável para Lula fazer
campanha.
Eles atribuem
essa realidade à "enxurrada de fake news", que precisariam ser
respondidas. Mas reconhecem a incapacidade de direcionar o debate para temas
incômodos a Bolsonaro, como a atuação do governo durante a pandemia da Covid-19
e a concessão de benesses às vésperas do pleito. Petistas avaliam que, no
segundo turno, só conseguiram "correr atrás" para responder acusações.
Se em 2018 o
mote de Bolsonaro para inflamar as redes e aliados estava ligado à "ameaça
ao comunismo", agora petistas identificaram um esforço concentrado para
pautar o debate da questão religiosa. O PT não consegue abandonar o tema nem
ampliar a rejeição de Bolsonaro com a exploração de episódios negativos do
presidente.
Membros do núcleo político de Bolsonaro
demonstraram, reservadamente, irritação com Paulo Guedes e descreveram o
episódio como uma "lambança". De acordo com eles, o ministro fala
demais e pode ter prejudicado Bolsonaro na reta final da campanha. Por outro
lado, esse grupo não quer criar um conflito com Guedes a poucos dias da
eleição, o que poderia piorar a situação.
A nota divulgada pelo Ministério da
Economia para desmentir a proposta de desvinculação do salário mínimo da
inflação — a manutenção do poder de compra do mínimo é assegurada pela
Constituição — foi considerada insuficiente, e o presidente gravou um vídeo
para rebater a polêmica.
— Consertamos a economia do Brasil,
estamos arrecadando muito. Assim sendo, a partir do ano que vem, a nossa
garantia de darmos a todos os aposentados e pensionistas um reajuste acima da
inflação. A mesma coisa no tocante aos servidores públicos, concedendo no ano
que vem o reajuste acima da inflação. E o valor do salário mínimo, como fica?
Também será dado um reajuste acima da inflação — prometeu Bolsonaro no vídeo,
sem indicar como isso será pago.
Além do próprio presidente, a gravação
também foi compartilhada por ministros. Antes disso, o candidato a vice, Walter
Braga Netto, já havia divulgado a nota da Economia. "Não há qualquer plano
para alterar as regras dos reajustes anuais do salário mínimo e das
aposentadorias pela inflação", escreveu ele.
Fonte: O Globo.
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