Ocaso lembra “Rashomon”, o clássico do cineasta japonês Akira Kurosawa em que a morte de um homem por outro que faz sexo com sua mulher ganha uma versão diferente de cada um dos envolvidos.
Psiquiatra avalia áudios de mulher que fez sexo com morador de rua, no Distrito Federal. Investigação do caso pode durar 30 dias na polícia.
Após flagrar a mulher tendo relações sexuais com um morador de rua, personal partiu para a agressão. Caso repercutiu. | Divulgação
No “Rashomon” de Planaltina, há uma semana, a Polícia Civil do Distrito Federal tenta descobrir o que realmente houve no episódio em que um morador de rua foi espancado pelo personal trainer casado com a mulher com quem estava tendo relações sexuais.
A resposta da polícia pode levar até um mês,
segundo o delegado Diogo Cavalcante, de Planaltina. "Cada um dá uma versão
para a história", afirmou Cavalcante.
É uma história muito sensível. O sem-teto, de
48 anos, foi agredido no dia 9 ao ser flagrado com a comerciante Sandra Mara
Fernandes, de 33 anos, em um carro. À polícia, Eduardo Alves de Sousa, o
marido, de 31 anos, disse que a mulher estava em surto e o homem aproveitou
para estuprá-la.
O morador de rua disse à polícia que a
relação foi consensual. O agredido contou em depoimento que Sandra fazia uma
ação de caridade com moradores de rua na região do Jardim Roriz, bairro de
Planaltina onde vivia. Ela estava acompanhada da sogra.
Em depoimento, Sandra negou o estupro e
chegou a dizer que beijou o homem na frente da mãe do marido. Ela acrescentou
que marcou um encontro com o sem-teto na rodoviária de Planaltina, onde ambos
foram descobertos, pois enxergava Deus e o companheiro, Eduardo, na figura do
morador de rua.
“Era o meu propósito”, diz a comerciante em
uma gravação que circulou nas redes sociais. No áudio, ela acrescenta que
massageou os pés do sem-teto e o presenteou com uma Bíblia que havia ganho de
Eduardo, antes de ter a visão.
Na quinta-feira, após sete dias no Hospital
Regional de Planaltina, o sem-teto foi para um abrigo fora da cidade-satélite,
depois de acolhido pela Secretaria de Desenvolvimento Social do Distrito
Federal. O local é mantido em sigilo.
Funcionários de um abrigo público onde o
morador de rua viveu por mais de três meses contam que ele havia se matriculado
em uma escola de ensino fundamental da cidade, além de trabalhar como autônomo
vendendo doces.
O homem agredido havia deixado o abrigo um
dia antes do episódio. Uma funcionária disse que o morador de rua não tem
histórico de agressividade. Segundo ela, o homem informou que deixaria o local
para ir a outra cidade.
De acordo com o psiquiatra Rafael Maksud,
pessoas em surto psicótico começam a apresentar alguns sinais, mesmo que sutis,
antes de acabarem chegando a um nível mais crítico da doença:
A pessoa, antes de chegar a um quadro clínico
agudo, vai dando alguns indícios de alteração de comportamento, de pensamento.
Em raras exceções, acontece de forma abrupta, quando há uso de substâncias
psicoativas ilegais.
SINAIS
O psiquiatra admite alguns sinais de que a
Sandra estivesse fora de si, como quando cita Deus, o que Maksud chama de
“delírio místico”. À polícia, Eduardo contou que a mulher havia começado a
frequentar a igreja há poucos dias, e não tinha o costume de evangelizar
ninguém.
"Quando ela fala da Bíblia, que sentia
que era uma missão dela, já é um discurso que pode-se subentender como
delirante místico, de conteúdo religioso. Se a pessoa está nesse quadro mais
agudo, pode gerar esse discurso desagregado e acreditar nessa fantasia",
diz Maksud.
Questionado se o morador de rua poderia
identificar o surto, como acusa o marido, o psiquiatra pondera que é difícil
afirmar, sem saber sobre a condição do sem-teto, se ele teria ou não esta
capacidade.
O médico também afirma que, se de fato a
pessoa estiver tendo um episódio psicótico, pode perder a percepção sobre o que
é certo ou errado, e sobre o que pode ou não fazer.
Diário Do Pará Com Informações Da Agência Globo
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