Um estudo da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) divulgado nesta terça (5) mostra que o consumo de bebidas alcoólicas responde por 12 mortes por hora e custa R$ 18,8 bilhões por ano ao país.
Estudo da Fiocruz revela que consumo de álcool causa 12 mortes/hora no Brasil, gerando custos de R$ 18,8 bilhões anuais. Conheça os dados.
Os homens foram as principais vítimas, representando 86% dos óbitos. | Reprodução
O levantamento, feito a pedido
das organizações Vital Strategies e ACT Promoção da Saúde, usou como base
estimativas de mortes atribuíveis ao álcool feitas pela OMS (Organização
Mundial da Saúde) e sistemas de dados públicos (leia abaixo sobre a metodologia).
Para o cálculo de custos, foram
consideradas 104,8 mil mortes em 2019 (ou 12 por hora) causadas por doenças
cardiovasculares, câncer, acidentes e violências, entre outras. Os homens foram
as principais vítimas, representando 86% dos óbitos.
Os gastos diretos com
hospitalizações e procedimentos ambulatoriais para tratar esses agravos somaram
R$ 1,1 bilhão em 2019, segundo o estudo. Os homens responderam por R$ 836,3
milhões desse montante.
Já os custos indiretos,
referentes a gastos com licença médica, aposentadoria precoce, perdas de
produtividade por presenteísmo e absenteísmo e mortes prematuras atingiram R$
17,7 bilhões.
Dentre os indiretos, o estudo
estimou um gasto previdenciário na ordem de R$ 47,2 milhões em 2019, dos quais
78% (R$ 37 milhões) são atribuíveis aos homens.
Para Pedro de Paula, diretor da
Vital Strategies no Brasil, conhecer os custos atrelados às consequências do
consumo de álcool para a saúde e os cofres públicos é fundamental para a
formulação de políticas públicas baseadas em evidências.
No momento, o Brasil discute uma
nova reforma tributária, cujo projeto está em tramitação no Senado. Entre
outras propostas está a criação de um imposto seletivo para desestimular o
consumo de produtos prejudiciais à saúde, como as bebidas alcoólicas.
De acordo com Eduardo Nilson,
pesquisador da Fiocruz responsável pelo estudo, o mesmo modelo usado para
estimar os custos diretos e indiretos do álcool pode ser usado para avaliar o
impactos da reforma tributária nesse cenário.
"A gente tem um benefício
de arrecadação que já está mais ou menos calculado, mas um benefício de redução
de despesa mesmo, de redução de perda de produtividade, por exemplo",
explica Nilson.
Estudos realizados em países
como Ucrânia, África do Sul, Tailândia e Finlândia, endossados pela OMS,
indicam que a tributação é a ação mais efetiva para a redução do consumo de
bebidas alcoólicas e, consequentemente, dos danos à saúde.
Antes da guerra, a Ucrânia
havia reduzido em 63% o consumo de álcool em oito anos, após um aumento do
preço das bebidas. Os resultados indicam que houve uma diminuição de 70 mil a
90 mil mortes anuais atribuíveis ao álcool.
"Está muito bem
documentado. Com o aumento do preço por litro, há redução do custo social do
consumo sem reduzir a arrecadação. Então, é um ganha-ganha", afirma Pedro
de Paula.
Pesquisa Datafolha realizada em
2023 mostra que 94% dos brasileiros apoiam o aumento de impostos para produtos
nocivos à saúde, como bebidas alcoólicas, cigarros e alimentos
ultraprocessados. A maioria da população (73%) também é favorável a que o valor
arrecadado com a maior tributação desses produtos vá para o SUS.
Nesta terça-feira também é
lançada a segunda fase da campanha intitulada "Quer uma dose de
realidade?", que tem por objetivo conscientizar legisladores e sociedade
sobre os efeitos nocivos do álcool para a saúde e o para bem-estar social.
A pesquisa da Fiocruz traz um
dado curioso sobre os atendimentos no SUS relacionados ao consumo de álcool. As
mulheres respondem por uma fatia bem menor (20%) das internações, o que
atribuído à menor prevalência de consumo (31% contra 63% dos homens) e ao
autocuidado que faz com que sejam tratadas antes que as complicações ocorram.
Porém, em relação aos custos
com atendimento ambulatorial, as mulheres respondem por 48,4% desses gastos.
"É um impacto muito grande e um problema que pode ser maior no futuro, em
especial, devido ao risco de câncer, em particular o de mama", diz Nilson.
De acordo com a OMS, o consumo
de álcool, mesmo que moderado, tornou-se um dos principais fatores de risco
para o câncer de mama. Entre as mulheres europeias, o tumor já é o principal
causado pelas bebidas alcoólicas, representando 66% de todos os casos de câncer
atribuídos a elas.
A preocupação torna-se maior se
considerados dados do Vigitel que mostram que a ocorrência de episódios de
consumo abusivo de álcool (quatro ou mais drinques em uma mesma ocasião) quase
dobrou entre as mulheres entre 2006 e 2023.
A mesma tendência de aumento é
apontada pela PeNSE (Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar) de 2019: 67% das
meninas já tinham experimentado álcool antes dos 17 anos, contra 60% dos
meninos.
COMO FOI FEITO O ESTUDO
O levantamento da Fiocruz foi
baseado em uma metodologia de análise comparativa de risco que estima as
frações atribuíveis a uma exposição (fator de risco ou proteção) em relação a
desfechos de saúde diretamente causados por essa exposição.
Foram consideradas as doenças e
mortes associadas ao consumo de álcool com uma relação dose-resposta entre a
quantidade consumida de álcool e o risco relativo dos desfechos a partir de
metanálises publicadas e utilizadas pelo estudo de Carga Global da Doença (GBD
– Global Burden of Disease) e pela OMS.
Em conjunto com a prevalência
de consumo de álcool para cada grupo de sexo e idade foi estimada qual a carga
atribuível para cada doença, segundo faixa de consumo de álcool, aplicada
posteriormente para os custos por doença.
As informações sobre custos
diretos foram obtidas em bases de dados públicos como sistemas de informação em
saúde e relatórios e microdados de pesquisas populacionais do IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística).
Já os custos diretos incluíram
informações do SUS a partir de dados de internações hospitalares e de
procedimentos ambulatoriais, desagregados por tipo de doença atribuível ao
consumo de álcool, sexo e idade.
"O estudo adotou uma
abordagem conservadora, já que é baseado exclusivamente em dados oficiais de
fontes públicas", diz Pedro de Paula, da Vital.
Também só foram considerados os
gastos da União, não incluindo eventuais custeios feitos por estados e
municípios. O levantamento não considerou os custos da rede privada de saúde,
nem o total de perdas econômicas à sociedade.
Autor:Cláudia
Collucci/Folhapress
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