O Instituto Oswaldo Cruz (IOC), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) será responsável por liderar um teste clínico histórico para a saúde pública mundial: uma etapa do desenvolvimento de uma vacina contra a hanseníase. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou na segunda-feira (14) a realização dos testes em humanos, e, se a pesquisa obtiver as respostas desejadas, esse pode ser o caminho para a população brasileira contar com uma vacina gratuita contra a doença.
O Brasil inicia testes clínicos da vacina LepVax contra hanseníase, com 54 voluntários, visando a saúde pública e a eliminação da doença.
Fundação Oswaldo Cruz será responsável pelo estudo clínico | Fernando Frazão/Agência Brasil
Candidata a ser a primeira
vacina contra a hanseníase, a LepVax foi desenvolvida pelo Access to Advanced
Health Institute (AAHI), instituto americano de pesquisa biotecnológica, sem
fins lucrativos. Com a moderna tecnologia de subunidade proteica, a vacina teve
testes pré-clínicos promissores contra a bactéria Mycobacterium leprae,
causadora da doença.
Antes de chegar a etapa de
estudos em humanos no Brasil, que contará com 54 voluntários, a vacina já teve
sua segurança demonstrada em testes em 24 pessoas sadias nos Estados Unidos. O
estudo mostrou a segurança da vacina, sem nenhum registro de evento adverso
grave. Também apontou imunogenicidade, ou seja, capacidade de estimular a
resposta imunológica.
Com o teste no Brasil, os
pesquisadores vão poder observar os efeitos da LepVax em um território com
transmissão da hanseníase. O Brasil concentra 90% dos casos da doença no
continente americano e também é o segundo país do mundo em número de
notificações da doença, atrás apenas da Índia. Em dez anos, de 2014 a 2023,
foram quase 245 mil novas infecções, segundo o Ministério da Saúde. Apenas em
2023, foram registrados 22.773 novos casos.
Portanto, considerando o
cenário epidemiológico do país, os pesquisadores acreditam que possivelmente o
sistema imunológico de grande parte dos brasileiros teve contato anterior com
micobactérias, o que pode influenciar na resposta à vacina.
A chefe do Laboratório de
Hanseníase do IOC/Fiocruz, Roberta Olmo, destaca que a realização do ensaio
clínico da LepVax no instituto da Fiocruz reflete o grau de maturidade
alcançado ao longo de anos de trabalhos pioneiros do laboratório, que
permitiram conquistar o reconhecimento da comunidade científica nacional e
internacional.
"A eliminação sustentada
da hanseníase enquanto problema de saúde pública requer uma vacina. Neste
cenário, a LepVax surge como uma vacina profilática e terapêutica, que poderá
contribuir para as metas de controle da doença", afirma ela.
O enfrentamento da hanseníase
está no escopo do Comitê Interministerial para Eliminação da Tuberculose e
Outras Doenças Determinadas Socialmente (Cieds), instalado em junho. O grupo de
nove pastas é liderado pelo Ministério da Saúde para buscar soluções contra
doenças negligenciadas, muitas vezes associadas à pobreza e a outros determinantes
sociais.
Para a hanseníase, as metas
incluem a interrupção da transmissão em 99% dos municípios, a eliminação da
doença em 75% dos municípios e a redução de 30% do número absoluto de novos
casos com incapacidade física aparente no momento do diagnóstico até 2030.
Três doses
O Instituto Oswaldo Cruz vai
avaliar a segurança e a imunogenicidade da vacina, além de investigar o uso de
duas formulações diferentes da vacina, com baixa e alta dose de antígeno. Para
isso, os participantes serão divididos aleatoriamente em três grupos: dois
receberão a vacina, sendo um com dose baixa e outro com dose alta; e o terceiro
grupo receberá o plaebo, que é uma solução salina, sem efeito biológico.
Cada um dos participantes
receberá três doses da aplicação correspondente ao seu grupo, com 28 dias de
intervalo. Depois disso, eles serão acompanhados por um ano. Para participar, é
preciso ter entre 18 e 55 anos, boas condições de saúde e não estar grávida.
Além disso, os voluntários não podem ser pessoas que já tiveram a doença ou
contato próximo com pacientes com hanseníase.
O dermatologista e pesquisador
do Ambulatório Souza Araújo, Cássio Ferreira, explica em, texto divulgado pelo
Instituto Oswaldo Cruz que a segurança da vacina será avaliada através do
acompanhamento clínico e de exames laboratoriais. “Nos Estados Unidos, o
resultado foi muito positivo, sem nenhum evento adverso de maior gravidade. As
reações registradas, como dor no local da injeção, cansaço e dor de cabeça, são
comuns em imunizações. Essa primeira demonstração de segurança foi fundamental
para a pesquisa avançar.”
O Instituto Oswaldo Cruz foi
escolhido como centro clínico responsável pelos testes e o Instituto de
Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) é o patrocinador do
ensaio clínico. O projeto da LepVax é financiado pela entidade filantrópica
American Leprosy Missions (ALM), dos Estados Unidos, que lidera o
desenvolvimento da vacina desde 2002. O estudo no Brasil também tem
financiamento do Ministério da Saúde e do fundo japonês Global Health
Innovative Technology Fund (GHIT Fund). A Fundação de Saúde Sasakawa, do Japão,
é parceira da pesquisa.
Autor:Vinicius Lisboa/Agência
Brasil
0 Comentários