Atuando nos bastidores para fazer uso político do Projeto de Lei 1904/2024, conhecido como "PL do Estupro", que equipara a interrupção de gestação acima de 22 semanas ao crime de homicídio, o pastor Silas Malafaia, "conselheiro espiritual" de Jair Bolsonaro (PL), divulgou um vídeo para defender o autor da proposta, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que colocou a proposta em regime de urgência na casa legislativa.
Em declaração perversa contra as mulheres, "conselheiro espiritual" de Bolsonaro, que atua nos bastidores do PL do Estupro, mente ao se referir à legislação atual.
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Silas Malafaia defendendo o PL do Estupro e Lira e ao lado do "poste" Sóstenes Cavalcante-Créditos: Reprodução Youtube / Facebook |
Ao defender o PL de autoria de
seu pupilo, assinado por outros 31 fundamentalistas como Eduardo Bolsonaro
(PL-RJ) e Nikolas Ferreira (PL-MG), Malafaia revelou toda sua perversidade ao
afirmar que as mulheres usam a lei atual para mentir que foram estupradas e,
dessa forma, conseguir fazer o aborto legal.
"Escute: estava na Lei que
uma mulher que sofre um estupro tem que ir na delegacia, fazer um registro,
denunciar o estuprador, para o médico fazer o aborto. O que a esquerda fez?
Retirou isso para proteger o estuprador. E qual a desculpa? É para a mulher chegar
diante do médico e mentir. É só ela dizer: fui estuprada. Pronto, se faz o
aborto", afirmou o conselheiro de Bolsonaro, com requintes de crueldade.
Malafaia se regia a chamada Lei
do Minuto Seguinte (12.845/2013), que oferece garantias a vítimas de violência
sexual, como atendimento imediato pelo SUS, amparos médico, psicológico e
social, exames preventivos e informações sobre direitos.
Sancionada pela presidenta
Dilma Rousseff (PT) em agosto de 2013, a Lei evita que a mulher passa por
quaisquer constrangimentos no momento traumático, tendo que se dirigir à
delegacia para registrar a ocorrência.
No entanto, diferentemente do
que diz Malafaia, a lei estipula e, sei artigo 3º, inciso III, a
"facilitação do registro da ocorrência e encaminhamento ao órgão de
medicina legal e às delegacias especializadas com informações que possam ser
úteis à identificação do agressor e à comprovação da violência sexual".
Além disso, a legislação estipula atendimento prioritário às mulheres, que
podem decidir depois de fazer a denúncia se vai realizar o aborto ou não.
O pastor mente de forma
descarada ao dizer que a mulher realiza um aborto imediatamente, apenas
"mentindo" que foi estuprada como alega.
Ao final do vídeo, parabeniza
Sóstenes Cavalcante e Arthur Lira pela tramitação do projeto.
"Parabéns, Arthur Lira,
presidente da Câmara, que deu urgência ao projeto, a sua coragem. Parabéns,
deputado Sóstenes Cavalcante, pelo projeto de proteger indefesos e a
vida", diz Malafaia, que usou o mesmo termo - "abortistas" - que
o pupilo para atacar os críticos do projeto.
Uso político eleitoral
"Poste" de Malafaia
na Câmara, o líder da bancada evangélica Sóstenes Cavalcante escancarou a
intenção política eleitoral logo após a aprovação, em 23 segundos, do regime de
urgência à proposta, que não precisará passar pelas comissões da Câmara e
poderá ir à votação no Plenário ainda nesta semana.
"Quero aprovar esse
projeto para ver se ele [Lula] vai sancionar ou se vai vetar", afirmou
Cavalcante, que agora faz chantagem para tirar o PL da pauta.
"Se o PSOL retirar a ação,
posso retirar o projeto. Claro que tenho que conversar com os demais autores.
Mas só fizemos o projeto por causa dessa ação. O PSOL precisa ter juízo e parar
de judicializar a política", disse ao se referir à decisão do ministro
Alexandre de Moraes, do STF, do dia 17 de maio que suspendeu a resolução do
Conselho Federal de Medicina (CFM) que proíbe médicos de realizarem a chamada
"assistolia fetal". O procedimento é usado nos casos de aborto legal
decorrentes de estupro para gravidezes com mais de 22 semanas.
A decisão do Supremo atendeu a
um pedido do PSOL, o partido argumentou que, ao estabelecer a proibição do
procedimento a partir das 22 semanas de gestação, a norma impõe barreiras que
não estão previstas na lei, nem na Constituição. A regra também violaria
direitos como o da saúde, livre exercício da profissão, dignidade da pessoa
humana.
Ao jornal O Globo, Cavalcante
voltou à tona e sinalizou que a horda bolsonarista pretende usar o tema para
pautar o debate político eleitoral, já prevendo que, diante da reação da
sociedade, a votação só deve ocorrer - se ocorrer - após as eleições.
"Não estou com pressa
nenhuma. Votei a urgência e agora temos o ano todo para votar isso. O Lira tem
compromisso conosco e ele pode cumprir até o último dia do mandato dele",
afirmou.
"O governo está dando
corda para as feministas nesse assunto, elas estão desesperadas. Eu estou muito
calmo, deixa elas sapatearem. Eu já ganhei, votamos a urgência, sem nominal,
ninguém chiou, tudo caladinho, tudo dominado, dominamos 513 parlamentares. Eu
sei jogar parado, eu jogo parado", emendou na entrevista divulgada pelo
jornal da família Marinho nesta segunda-feira (17).
“Poste” de Malafaia
Pastor licenciado da Assembleia
de Deus, Sóstenes Cavalcante atua como “poste” de Silas Malafaia, o
“conselheiro espiritual” de Jair Bolsonaro (PL) na Câmara.
Principal articulador da
aliança entre o pastor midiático e o clã Bolsonaro, ainda em 2017, Cavalcante
atua como braço político de Malafaia no Congresso nacional e foi eleito, em
2022, líder da bancada evangélica por meio de um golpe dado em conjunto com o
líder Assembleia de Deus Vitória em Cristo.
Cavalcante chegou ao posto após
debate público entre Malafaia e parlamentares e bispos ligados ao
ex-presidente, Cezinha de Madureira (PSC-SP), que expôs a guerra em torno do
comando da bancada evangélica.
A principal batalha foi travada entre Malafaia, líder da Assembleia
de Deus Vitória em Cristo, e Samuel Ferreira, que comanda a Assembleia de Deus
no Brás – Ministério de Madureira.
A briga começou quando Ferreira
anunciou que faria campanha para manter o deputado Cezinha na liderança da
bancada durante a posse do “terrivelmente evangélico” André Mendonça no Supremo
Tribunal Federal (STF).
A declaração irritou Malafaia,
que trabalhava em cima do acordo já costurado para o nome de Cavalcante.
Em seguida, farpas públicas
foram trocadas apoiadores de Cezinha e Malafaia, que chamou Samuel Ferreira de
"arrogante asqueroso" em áudio distribuído em grupos da bancada.
Cristão de fuzil
Após assumir a bancada,
Cavalcante passou a obedecer as ordens de Malafaia e chegou até mesmo abandonar
sua posição de armamentista para defender que "o cidadão pode ter uma arma
de grosso calibre, um fuzil".
"Ter uma arma na sua casa, na sua
propriedade rural não é anticristão. É defesa pessoal. É ele ou eu. O bandido
ou eu. À luz da minha fé, isso não é pecado. O bandido anda armado para matar e
eu vou me defender. A teologia cristã defende que a vida é o bem maior. Não
existe pecado", disse, ao justificar a mudança de posição.
Como líder da bancada
evangélica, Cavalcante é usado por Malafaia e Bolsonaro para polemizar temas
que têm forte impacto entre os fiéis junto ao governo Lula, culminando no
projeto de criminalização das mulheres vítimas de estupro que engravidarem.
Além de usar o pupilo para
ataques ao governo, Malafaia ainda ensaia voos mais altos com a indicação de
Cavalcante para a vice-presidência da mesa diretora da Câmara, na chapa apoiada
por Arthur Lira, o que explica a aprovação relâmpago do regime de urgência para
o PL que criminaliza as mulheres vítimas de estupro que optarem por abortar.
Fonte: Revista Fórum
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