Ter uma conta em redes sociais se tornou tão comum que é até difícil encontrar alguém que resista a alimentar ao menos um perfil nas mais diversas plataformas. A facilidade com que elas se popularizaram é a mesma com que até contas fakes são criadas e que essa “vida virtual” seja um recorte da “vida real”, com atitudes sendo criticadas e julgadas com difamações, injúrias e calúnias. Nem sempre quem está por trás da tela e do teclado se comporta com respeito ao próximo, como se a internet fosse uma terra sem lei. O que não é!
Calúnia, difamação e injúria são práticas criminosas comuns no ambiente virtual, trazendo diversos prejuízos psicológicos para quem é atacado. Mas saber como denunciar é importante.
Criminosos geralmente agem usando perfis fakes nas redes sociais | (Foto: Divulgação )
Por vezes, quem é vítima de ataques virtuais não sabe como agir ante a exposição de sua privacidade e o desenrolar de cada história pode terminar mal, com episódios de ansiedade, depressão e até tentativas de suicídio. E você? Sabe como agir em cada uma dessas situações? Em busca dessa resposta, o DIÁRIO entrevistou o PhD em Ciência da Informação, Thiago Ximenes, que também é mestre em Direito. Confira a seguir!
P Como identificar crimes de calúnia na internet?
R O crime de calúnia está descrito no artigo 138 do Código Penal brasileiro e consiste em imputar a alguém um fato (historinha) criminoso falso. Isto é, se trata de um crime contra honra objetiva (que está relacionada ao julgamento de terceiros com relação à vítima) da pessoa. Então, caso alguém veja postagens nas redes sociais lhe acusando de um crime que não praticou, estaremos diante da calúnia. Um exemplo real, que ocorreu inclusive em nossa cidade, há muito tempo, foi de uma mulher que espalhou a notícia de que seu ex-namorado estaria com uma seringa contendo sangue com HIV, e que ele estaria injetando nas pessoas. Um outro exemplo foi fulano que furtou a televisão de sicrano ontem à noite.
R O crime de difamação está disposto no artigo 139 do Código Penal e consiste em imputar fato (historinha) ofensivo a sua reputação. Diferente da calúnia, na difamação o fato contado não é considerado crime. Ressaltamos, que este tipo de crime é bem comum na internet, principalmente em redes sociais. Um exemplo interessante seria alguém que faz uma postagem dizendo que viu determinada menina fazendo programas em uma boate. Outro seria que viu determinado homem no restaurante X com sua amante. Percebam que, ainda que o fato seja verdadeiro, o crime de difamação existe, pois, o fato não sendo criminoso, não interessa para o Estado a vida pessoal de ninguém.
P E os crimes de injúria?
R O crime de injuria está descrito no artigo 140 do Código Penal e consiste em injuriar (xingar) alguém com objetivo de ofender a dignidade ou decoro. Como exemplo, podemos ter: alguém faz uma postagem chamando seu vizinho de ladrão, traficante, estuprador etc. Ou ainda chamar um palavrão para alguém. Importante ressaltar, que no crime de injúria não temos nenhuma historinha, e sim apenas o xingamento. É importante alertar que a injúria relacionada à raça, cor, etnia ou procedência nacional, no início do ano passado se transformou em crime de racismo, que é muito mais grave por ser inafiançável e imprescritível, e com pena de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Exemplo desse crime é chamar uma pessoa preta de ‘macaco’.
P Quem comete esses tipos de crimes está sujeito a que tipos de penalidades?
R Calúnia - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
Difamação - detenção, de três meses a um ano, e multa.
Injúria - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Em todos os três crimes, a pena será aumentada em triplo caso seja praticado por meio de redes sociais na internet.
P Como a vítima deve agir?
R A vítima, ao visualizar a postagem, deve de imediato fazer um ‘print para garantir que não irão apagar as provas.
P Onde denunciar?
R A vítima deve procurar uma delegacia de polícia, e caso não saiba quem é o autor da postagem é melhor procurar a Diretoria Estadual de Combate a Crimes Cibernéticos (DECCC).
P Como combater e coibir esse tipo de ataque nas redes sociais?
R Atualmente, é bem complicado o combate a esses tipos de crimes contra a honra, pois, muito são os perfis fakes (falsos), e ainda que sejam verdadeiros, controlar o que as pessoas querem publicar é uma tarefa impossível. Por outro lado, se as vítimas procurarem as autoridades e fizerem os procedimentos legais cabíveis, pode ser que haja uma redução nesse tipo de comportamento criminoso.
P Como se proteger?
Infelizmente, podemos ser vítimas de delitos contra honra a qualquer momento, ainda que não tenhamos nenhuma conduta inadequada. Acredito que, a melhor forma de se “proteger’ é ao menos conhecer todas as pessoas que fazem parte de sua rede social e nela ter o mínimo de confiança.
P Quais desses crimes são os mais comuns?
R Sem dúvidas a difamação e a injúria.
P O que mais acha importante recomendar para quem tem rede social?
Eu sempre costumo dizer que a cada dia as pessoas estão se expondo mais nas redes sociais, isso pode acarretar danos irreparáveis, principalmente relacionado a saúde mental, isto é, trazer vários problemas psicológicos os quais podem levar a tragédias maiores como o suicídio. Aconselho que saibam utilizar a internet e suas ferramentas, como as redes sociais, com sabedoria e responsabilidade, assim, muitos problemas poderão ser evitados. Educação tecnológica não é, simplesmente, aprender a manusear um equipamento, e, sim, a ter consciência dos benefícios e malefícios que estes podem trazer.”
Abalo psicológico
Saber como agir frente a um ataque virtual não se resume apenas ao lado jurídico. Muitas vezes, a depender de quem sofre com a situação, o abalo pode trazer graves consequências emocionais. A psicóloga Silvana Nóvoa destaca que crianças e adolescentes podem ser as mais afetadas com esse tipo de problema.
“Hoje crianças, adolescentes, adultos e idosos têm acesso à internet. Então, podemos dizer que esses impactos são muito maiores nas crianças e adolescentes. Por isso, há toda uma preocupação enorme que os pais, cuidadores, responsáveis das crianças e adolescentes devem ter. Porque eles não têm a maturidade suficiente para discernir. Imagine uma criança que uma outra criança posta algo que ela não fez, que a gente chama isso de cyberbullying. Imagine na adolescência uma fase extremamente de transição, de conflitos, de busca de novas identidades, de busca de pertencimento, de encontrar uma profissão. Ele recebe ou visualiza no seu site ou no seu Instagram, no seu Facebook, injúrias e difamações ou calúnias em relação ao seu pai, em relação à sua mãe ou em relação ao seu próprio comportamento”, ilustra.
“Então ele não tem aquela maturidade necessária para entender que muitas vezes aquilo é feito para atingi-lo. Para que um ‘amigo’ que não gosta dele o afaste daquela menina ou daquele colégio. Então podemos dizer que os efeitos emocionais que calúnias, difamações ou injúrias podem provocar, vão desde a dificuldade desse jovem, dessa criança em se relacionar com outras crianças, gerando e provocando depressão”, alerta. “Também pode provocar síndrome do pânico, ansiedade”.
Segundo Silvana, em alguns casos o jovem e a criança não querem mais frequentar a escola, passam a não dormir direito, a ter insônia e entrar num quadro de ansiedade, crise de pânico e, muitas vezes, em casos mais graves, suicídio. “Em relação aos adultos também. Podemos dizer que, dependendo da faixa etária, do momento em que aquele adulto se encontra, o seu grau de maturidade, também temos efeitos bastante maléficos para ele, porque isso pode gerar também sintomatologias depressivas, fazer com que alguns adultos façam uso de substâncias psicoativas, também com tentativas de suicídios e dificuldade de inclusive retornar ao trabalho”, relata.
“Imagine sair na internet que você foi flagrado com uma mulher, ou que a sua esposa foi flagrada com outro homem, ou que você cometeu algo no seu local de trabalho que você não cometeu? Hoje, ainda mais com a questão da inteligência artificial, nós todos estamos muito mais vulneráveis, os adultos também. Então é preciso ter maturidade, discernimento”.
De acordo com Silvana Nóvoa, a melhor forma de se proteger é justamente não se deixar abater, se abalar. “E buscar os seus direitos, porque todo o mundo está sujeito que vazem algo que seja verdadeiro ou mentira. Nós somos muito expostos o tempo todo. As pessoas estão filmando, estão fotografando. Estão buscando formas de poder se mostrar e também mostrar quem está ao seu redor. É a questão da visibilidade” pontua.
“Penso que é preciso diminuir a exposição e saber os seus direitos, saber o que é que você pode fazer no momento de uma injúria, calúnia ou difamação e buscar seus direitos jurídicos com advogados. Psicologicamente é ter consciência de quem é você, do que que você fez, do que é que você faz. Maturidade suficiente para não deixar que o outro seja capaz de tirar sua paz e tirar a sua tranquilidade”.
A psicóloga orienta que os pais podem e devem proteger seus filhos, orientando e tendo o controle da quantidade de horas que eles ficam na internet, além de observarem o conteúdo que esses filhos enviam e recebem. “Sempre alertar que eles também estão sujeitos a calúnias, difamações e injúrias. Não transformar isso em algo autodestrutivo para que eles não se isolem e não queiram mais ter contato com as pessoas. É preciso passar confiança para evitar a baixa autoestima”, aconselha.
Hoje crianças, adolescentes,
adultos e idosos têm acesso à internet. Então, podemos dizer que esses impactos
são muito maiores nas crianças e adolescentes. Por isso, há toda uma
preocupação enorme que os pais, cuidadores, responsáveis das crianças e
adolescentes devem ter” Silvana Nóvoa, psicóloga
Autor:Luiz Octávio Lucas/ Diário do Pará
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