Notícias falsas e mentiras políticas não são novidade para a Justiça Eleitoral, que, ao menos até 2018, precisava julgar inverdades ditas sobre candidatos e partidos, parte quase essencial da disputa eleitoral.
Entenda as regras da Justiça Eleitoral que disciplinam a divulgação de notícias falsas durante a campanha para as eleições do próximo dia 2 de outubro.
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A Justiça Eleitoral prevê punição para o uso das fake news nas disputas eleitorais. | (Foto: Reprodução/Pixabay) |
No juridiquês eleitoral, as fake news - e qualquer informação
errada ou ato ilícito abarcados por esse termo - são chamadas de "fatos
sabidamente inverídicos" e costumam aparecer em embates entre rivais.
A profusão de conteúdo pelas redes sociais e as alegações de fraude
sobre as urnas eletrônicas, insufladas sem provas pelo presidente Jair
Bolsonaro (PL), levaram a Justiça a atuar não só na disputa entre candidatos,
mas na briga contra o sistema eleitoral.
No pleito de 2022, o TSE tem regras que deixaram
explícitas a possibilidade de punição contra inverdades ou fatos
"gravemente descontextualizados" sobre a integridade das urnas e do
processo de votação.
Veja essa e outras regras para o pleito de outubro.
Quais fake news podem
ser alvo de remoção por ordem judicial?
A Justiça Eleitoral
possui ampla margem para determinar a remoção de conteúdo das redes sociais. De
acordo com as regras, a livre manifestação dos eleitores é passível de
limitação "quando ofender a honra ou a imagem de candidatas, candidatos,
partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente
inverídicos".
Divulgar fake news é
crime?
Na legislação eleitoral, sim. Ela diz que é crime
divulgar "fatos que sabe inverídicos", na propaganda eleitoral ou
durante o período de campanha, sobre partidos ou candidatos e que possam
exercer influência perante os eleitores.
Uma novidade nesta eleição é que a regra agora tem
redação que permite uma aplicação mais ampla, ao abranger o que for divulgado
"durante o período de campanha". Antes, a aplicação estava atrelada à
interpretação dos juízes do que estaria ou não abarcado no conceito de
propaganda eleitoral, o que parte deles entende, por exemplo, que está restrito
a conteúdos de candidatos e partidos.
As regras sobre propaganda eleitoral ainda deixam claro que candidatos
têm responsabilidade sobre uso de conteúdos que sejam compartilhados, não
necessariamente produzidos, por eles. O que for publicado ou endossado pelas
campanhas deve passar por verificação da "fidedignidade da
informação".
Qual a punição para
fake news eleitoral?
Além da possibilidade de remoção do conteúdo, quem
divulgar "fatos que sabe inverídicos" sobre partidos ou candidatos e
que possam "exercer influência" perante os eleitores pode ser punido
com dois meses a um ano de detenção ou pagamento de multa.
Quando o crime é cometido na internet, na imprensa, no rádio ou na TV,
ou é transmitido em tempo real, a pena de prisão pode ser ampliada em um terço
ou até a metade do seu prazo; por exemplo, se a pena for de um ano, pode ser
ser acrescida de quatro ou seis meses. A pena também aumenta quando a fato
inverídico envolve menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou à sua
cor, raça ou etnia - já que a eleição deste ano tem o novo crime de violência
política de gênero.
Qual a
responsabilidade das redes sociais?
A responsabilidade por danos causados por uma
publicação é atribuída ao autor, mas as redes sociais têm obrigação de remover
conteúdo mediante ordem judicial.
As plataformas também têm regras próprias de
moderação, podendo eliminar textos, imagens e vídeos que infrinjam suas
diretrizes. A maioria delas tem políticas que proíbem mentiras que visem
suprimir votos, como divulgação de datas, horários e locais errados da eleição.
Conteúdos dedicados a minar a confiança das urnas são excluídos apenas por
algumas redes e dependem de denúncias de usuários.
O que a Justiça diz sobre mentiras associadas às urnas eletrônicas?
A chamada propaganda negativa - briga política
entre candidatos que pode incluir mentiras - há tempos é regulada pela Justiça.
Uma novidade deste pleito é que o TSE evidenciou
que a divulgação e o compartilhamento de mentiras ou fatos "gravemente
descontextualizados" sobre o sistema eleitoral também podem ser removidos.
Entram no escopo inverdades sobre as urnas eletrônicas, o sistema de apuração e
a totalização dos votos.
"O que passou a ser regulado de forma mais
ampla é a mentira a respeito do processo eleitoral em si. O TSE passa a olhar
com cuidado o que extrapola a relação particular entre os candidatos e mira,
digamos, a esfera mais pública", diz André Giacchetta, advogado do
escritório Pinheiro Neto.
Qual a punição para candidatos que divulgam mentira sobre o pleito?
Além da possibilidade de terem os eventuais
conteúdos removidos, candidatos que divulgarem mentiras sobre o sistema
eleitoral brasileiro podem ter o mandato cassado ou serem declarados
inelegíveis.
Isso ocorre se houver entendimento de que a conduta
do político em questão está enquadrada como abuso de poder político ou
econômico, além de uso indevido de meios de comunicação social. Um dos
critérios avaliados nesses casos é se a ação teve impacto suficiente para
desestabilizar o pleito.
A depender do caso concreto, é possível que haja a
apuração de outros ilícitos ou crimes em conjunto.
Já houve punição por divulgação de fake news sobre urna?
O parlamentar Fernando Francischini (União
Brasil-PR) foi o primeiro a ter a candidatura cassada por divulgar fake news
sobre o sistema eleitoral. No dia da votação em 2018, a menos de uma hora para
o fechamento das urnas, ele fez uma transmissão ao vivo em sua conta no
Facebook para divulgar mentiras sobre o pleito.
Em 2021, o TSE decidiu cassá-lo por entender que
houve abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação social
para promover ataques à democracia. Houve críticas à decisão devido ao debate
em torno do impacto da transmissão para desestabilizar o pleito. O entendimento
levou à anulação de seus votos de 2018. Na época, ele era deputado federal e
concorria a um assento de deputado estadual.
Que outros crimes estão ligados à propaganda eleitoral?
A legislação eleitoral também traz tipos penais
similares a crimes contra honra previstos no Código Penal. Ao ingressar com
ações sobre discurso de ódio e desinformação, por exemplo, os candidatos em
geral citam ilícitos como ofensa para pedir a remoção de conteúdos.
Caluniar alguém (imputar falsamente um crime) na
propaganda eleitoral é crime com pena de detenção de seis meses a dois anos e
multa. Também pode ser punido quem, sabendo que é falsa, divulga a informação.
Já difamação (imputar fato ofensivo à reputação) tem pena de detenção de três
meses a um ano e multa, e o crime de injúria (ofender a dignidade ou o decoro),
prisão até seis meses ou multa.
É possível ter
direito de resposta?
A concessão de
direito de resposta pressupõe ofensa ou afirmação caluniosa, difamatória,
injuriosa e inverídica inserida no contexto de propaganda eleitoral, portanto
não cabe em qualquer comentário de usuários de internet. Ele também pode ser
exercido em perfis de redes sociais, embora a operacionalização seja mais
difícil.
FOLHAPRESS
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