O presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Marcelo Lopes da Ponte, disse, nesta quinta-feira (7), que terceiros usaram o nome dele e do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, sem autorização, para fazer lobby em questões ligadas à pasta.
A declaração foi dada em audiência pública na Comissão de Educação do
Senado, em que Ponte foi chamado a dar explicações sobre
uma suposta cobrança de propina que os pastores
evangélicos Gilmar Santos e Arilton Moura teriam feito junto
a prefeitos de várias regiões do país em troca de liberação de verbas
do MEC. Segundo três prefeitos ouvidos pelo colegiado
nesta semana, os religiosos cobravam propinas entre R$
15 mil e R$ 40 mil para viabilizar as demandas dos municípios na pasta.
“O ministro Milton Ribeiro é pessoa da minha mais elevada estima, de
cordialidade, respeito. Acredito na conduta dele, na postura que teve frente
ao Ministério. Minha relação com ele sempre foi a melhor possível.
Acredito que terceiros usaram o nosso nome para se gabaritar ou para fazer
lobby sem a nossa autorização”, afirmou Marcelo Ponte.
Repasses
Ainda segundo Ponte, o repasse de verbas a todos municípios
citados como envolvidos no esquema de favorecimento intermediado pelos
religiosos “foi suspenso pelo FNDE cautelarmente”.
À Comissão de Educação, o presidente do FNDE disse que
conheceu os pastores em eventos do MEC e que se lembra da presença dos
investigados em, pelo menos, quatro agendas que
participou. Sobre como se dava a participação de Gilmar Santos
e Arilton Moura em agendas e eventos do MEC e porque, mesmo
sem qualquer cargo público, eles ocupavam assento de destaque nas solenidades
ao lado do ex-ministro Milton Ribeiro, Ponte respondeu que essa era uma questão
decidida pelo cerimonial da pasta.
Ainda sobre os eventos, Marcelo Ponte disse que nessas ocasiões a
função dos prefeitos era de cunho religioso. “Às vezes faziam alguma
fala, alguma oração. Foi o que eu percebi, que eu tive entendimento. Nada além
disso que eu tenha percebido. Eram o que eles geralmente faziam”, contou.
Questionado se ninguém soube e nem tomou providências sobre a suposta
intermediação dos pastores na liberação de recursos do MEC, o presidente do
FNDE disse à Comissão que, em agosto do ano passado, o então ministro
Milton Ribeiro levou à CGU “uma conversa torta nesse sentido”,
mas a investigação corre em segredo de Justiça.
“Eu não estive com eles [pastores Gimar e Arilton] depois disso”, afirmou.
Ônibus superfaturado
Além do suposto tráfico de influência no MEC, o presidente do FNDE
também respondeu sobre denúncias de licitação superfaturada da
entidade envolvendo a aquisição de ônibus escolares. “Quanto a isso,
informo que a imprensa divulgou o relatório um mês após todas as providências
terem sido superadas pela nossa área técnica. Ressalto que o valor final do
pregão apresentado foi resultado de pesquisa de preços conforme previsto nas
instruções normativas do Ministério da Economia”, explicou.
Ao insistir na lisura do processo, Marcelo Ponte afirmou que todas
as recomendações das autoridades fiscalizadoras foram atendidas. “Atendemos
todas as recomendações apontadas na auditoria preventiva da CGU, realizada em
fevereiro. Realizamos os ajustes solicitados pela metodologia de cálculo para
realização do pregão, e reforço que o pregão vem sendo acompanhado pela
Controladoria-Geral da União em todas as suas fases”.
Na licitação, no âmbito do programa Caminho na Escola, financiado pelo
FNDE, o órgão estimava investir R$ 700 milhões na compra de 3.850
veículos para uso exclusivo dos alunos da rede pública em
escolas de regiões rurais. Segundo denúncia, o governo
federal teria aceitado desembolsar R$ 480 mil em modelos avaliados em R$
270 mil. Após as suspeitas, o Tribunal de Contas da União (TCU) suspendeu
o pregão.
Ausência
Além do presidente do FNDE, os pastores acusados de tráfico de
influência também seriam ouvidos hoje pela Comissão, mas se
recusaram a comparecer para dar explicações. Por meio de carta,
enviada ontem (6) ao colegiado, os advogados dos
religiosos justificaram a ausência deles pelo
fato de ambos já terem prestado “todos os esclarecimentos à
autoridade judicial competente”.
O presidente do FNDE também foi cobrado a explicar denúncia publicada na
edição de hoje do jornal Folha de São Paulo. Segundo o jornal, o MEC
destinou R$ 26 milhões para a compra de kits robótica para escolas do
interior do estado de Alagoas, que não têm salas de aula, computadores,
internet ou até agua encanada. Sobre o assunto, Ponte disse que é de
responsabilidade das prefeituras indicar quais escolas vão receber o
recurso. Segundo ele, ao FNDE cabe apenas repassar a verba.
Histórico
As suspeitas sobre a atuação de Gilmar Santos e Arilton Moura na
liberação de recursos da educação mediante propina vieram à
tona no final do mês passado. À época foi divulgado um
áudio no qual o então ministro da pasta, Milton Ribeiro, diz que dava
prioridade a pedidos feitos pelo pastor Gilmar, por demanda do presidente da
República, Jair Bolsonaro.
As denúncias, que surgiram na imprensa em março, levaram à queda de
Milton Ribeiro, que também é pastor, no último dia 28. À época, em
sua defesa, o ex-ministro afirmou que não praticou atos
ilícitos. “Tenho plena convicção de que jamais pratiquei qualquer ato de
gestão que não fosse pautado pela legalidade, pela probidade e pelo compromisso
com o erário. As suspeitas de que foram cometidos atos irregulares devem ser
investigadas com profundidade”, destacou.
Em nota, ele acrescentou que decidiu solicitar ao presidente Bolsonaro a
exoneração do cargo de ministro para que não paire nenhuma incerteza sobre sua
conduta e a do governo federal. “Meu afastamento visa, mais do que tudo, deixar
claro que quero uma investigação completa isenta”.
Investigação
Milton Ribeiro é alvo de investigação por suposto favorecimento na
liberação de recursos para prefeituras por meio da intermediação de dois
pastores. A Polícia Federal, a Controladoria-Geral da União (CGU) e o
Tribunal de Contas da União (TCU) apuram as suspeitas de irregularidades
envolvendo o FNDE e o MEC.
Foto: © Pedro França/Agência Senado / Fonte: Agência Brasil
0 Comentários