A Polícia Federal apontou que o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime de violação de sigilo funcional ao divulgar o conteúdo de um inquérito sigiloso a respeito do ataque hacker aos sistemas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em uma live realizada por ele em agosto do ano passado, para tentar desacreditar o sistema de votação em urna eletrônica.
O presidente Jair Bolsonaro (Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
“Considerando
os elementos de interesse coligidos, que apontam a autoria, a materialidade e
as circunstâncias da divulgação, de conteúdo de inquérito policial por
funcionários públicos (presidente da República, ajudante de ordem e deputado
federal), na live do dia 4 de agosto de 2021 e sua publicização por diversos
meios, com o nítido desvio de finalidade e com o propósito de utilizá-lo como
lastro para difusão de informações sabidamente falsas, com repercussões danosas
para a administração pública, dá-se por encerrado o trabalho da Polícia
Judiciária da União”, disse a PF em manifestação ao Supremo Tribunal Federal
(STF).
A delegada da PF responsável pelo
inquérito, Denisse Ribeiro, deixou de promover o indiciamento de Bolsonaro e do
deputado federal Filipe Barros (PSL-PR), que participou da live ao lado do
presidente, sob justificativa de que a corte tem entendimento de que pessoas
com foro privilegiado –como o presidente e o parlamentar– só podem ser
indicadas mediante prévia autorização do Congresso Nacional.
Procurada, a Advocacia-Geral da União (AGU)
informou que a manifestação dos órgãos jurídicos de representação da
instituição ocorrerá, se e quando cabível, nos autos do processo.
A
defesa de Bolsonaro afirmou anteriormente que não houve quebra de sigilo do
inquérito. Pelo Twitter, Barros também já disse que não havia sigilo no
inquérito sobre o ataque ao sistema do TSE.
A
conclusão do inquérito deverá ser encaminhada para a Procuradoria-Geral da
República (PGR) a quem caberá decidir se oferece denúncia contra os envolvidos,
promove novas diligências ou pede o arquivamento do caso por falta de elementos
para se fazer uma acusação criminal. A PGR não está vinculada ao entendimento
da PF sobre o caso.
Depoimento
A
delegada finalizou a instrução do inquérito na segunda-feira e encaminhou ao
ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF, na manhã desta quarta.
Essa conclusão da PF ocorreu depois que o próprio Bolsonaro não compareceu ao
depoimento marcado na sexta-feira da semana passada.
Desde
novembro passado, a PF havia pedido para tomar o depoimento do presidente no
inquérito, mas a defesa de Bolsonaro pediu sucessivos adiamentos. Moraes teve
de marcar a ida do presidente após ele não ter informado quando iria depor.
Para a delegada do caso, entretanto, a ausência
de Bolsonaro não comprometeu a investigação.
“Decorrido
o prazo estabelecido, não houve atendimento à ordem judicial mencionada,
inviabilizando-se a realização do ato e a consequente obtenção da perspectiva
do senhor Jair Messias Bolsonaro a respeito dos fatos. Essa situação,
entretanto, não teve o condão de impedir a correta compreensão e o
esclarecimento do evento”, disse.
A
delegada entendeu que o deputado federal Filipe Barros –que foi relator da PEC
do voto impresso em urnas eletrônicas– fez uma requisição formal do inquérito
sobre hackers do TSE para subsidiar a discussão da proposta. Entretanto,
segundo ela, o parlamentar entregou a documentação a Bolsonaro para ele usar o
material na “narrativa de vulnerabilidade do sistema eleitoral brasileiro”.
Em
4 de agosto do ano passado, o presidente e Filipe Barros fizeram uma live para
apresentar o documento para supostamente provar a fragilidade das urnas
eletrônicas.
O
inquérito sobre a suposta tentativa de invasão ao sistema do TSE em 2018 jamais
concluiu por qualquer fraude ou vulnerabilidade das urnas eletrônicas, ao
contrário da impressão que Bolsonaro procurou passar.
Segundo
a PF, Bolsonaro contou com a ajuda do tenente-coronel Mauro César Barbosa Cid,
atual ajudante-de-ordens dele. O militar, conforme a polícia apurou, “também
teve acesso à documentação em razão de seu cargo e disponibilizou o conteúdo da
investigação, via conta pessoal do presidente da República (por determinação
deste), com auxílio de seu irmão”.
O
tenente coronel, que não tem foro privilegiado, foi indiciado pelo crime de
violação de sigilo funcional cometido por funcionário público.
Milícias Digitais
Na
noite de terça, o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, disse que Bolsonaro
vazou dados sigilosos desse inquérito da PF sobre o sistema eleitoral que
ajudam “milícias digitais” e criminosos que tentam realizar ataques
cibernéticos ao sistema eleitoral brasileiro.
“Informações sigilosas que foram oferecidas à
Polícia Federal para auxiliar uma investigação foram vazadas pelo próprio
presidente da República em redes sociais, divulgando dados que auxiliam
milícias digitais e hackers de todo o mundo que queiram tentar invadir nossos
equipamentos”, afirmou Barroso em discurso na abertura do ano da Justiça
Eleitoral.
“O
presidente da República vazou a estrutura interna de TI do Tribunal Superior
Eleitoral. Tivemos que tomar uma série de providências de reforço da segurança
cibernética dos nossos sistemas para nos protegermos”, acrescentou o ministro,
que é alvo constante de ataques de Bolsonaro e de apoiadores do presidente.
infomoney
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