A imunogenicidade, ou a capacidade do organismo gerar resposta imune, é menor em homens e em pessoas com mais de 55 anos que receberam as duas doses da vacina Coronavac em comparação com recuperados da Covid-19, revela uma pesquisa conjunta do Instituto do Coração (InCor ) e da Universidade de São Paulo (USP).
O estudo, que tem entre os autores o médico imunologista Jorge Kalil, do
InCor, foi divulgado na forma de pré-print (sem avaliação de pares), indica
ainda que 95% dos participantes vacinados com o imunizante produziram algum
tipo de resposta imune contra o coronavírus Sars-CoV-2, frente a 99% dos chamados
convalescentes (ou recuperados).
Uma resposta protetora completa, formada tanto por anticorpos como por
células de defesa, esteve presente em 7 em cada 10 dos recuperados, mas em
apenas 59% dos vacinados.
Participaram do estudo também pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP, do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, do Instituto Israelita Albert Einstein de Ensino e Pesquisa, da Plataforma Científica Pasteur-USP, da Universidade Federal de São Paulo e do Instituto de Investigação em Imunologia (iii/INCT).
METODOLOGIA
Para avaliar os anticorpos específicos contra o Sars-CoV-2, os
cientistas testaram a presença de anticorpos anti-Sars-CoV-2 no soro sanguíneo
de vacinados (101 amostras), recuperados (72 amostras) e compararam a um grupo
controle (não vacinados e nem infectados; 36 amostras).
A taxa de anticorpos anti-spike (proteína S ou espícula do vírus, usada
para entrar nas células) no sangue dos convalescentes era de 1,5 a 2 vezes
maior do que a encontrada nas amostras dos vacinados. Essa diferença aumentava
em pessoas vacinadas com mais de 55 anos -nestes foi seis vezes menor que a
observada após uma infecção natural para o mesmo grupo.
Já a taxa de anticorpos anti-RBD (região de domínio de ligação, também
usada pelo vírus para invadir as células) era maior nos vacinados. Não houve
diferença em relação aos anticorpos anti-NP (nucleocapsídeo, a proteína que
envolve o material genético do vírus).
A quantidade de células de defesa do tipo linfócitos T, por outro lado, foi maior nos recuperados do que nos vacinados.
RESULTADOS
Comparando os dois grupos de idade, abaixo de 55 anos e com 55 anos ou
mais, foram observadas diferenças também entre os gêneros. Enquanto as mulheres
com mais de 55 anos apresentaram resposta humoral (de anticorpos) e celular em
60% das amostras analisadas, esse número caía para 28% no caso dos homens.
Os homens também foram os que apresentaram a menor resposta humoral
sozinha, com apenas 31% das amostras com anticorpos anti-Sars-CoV-2. A resposta
celular na ausência de anticorpos na mesma faixa etária foi maior para homens
(17%), e observada em apenas 3% das mulheres.
É importante destacar, porém, que a amostra é pequena (101 vacinados,
dos quais 42 têm mais de 55 anos) e que, mesmo com uma resposta imune
comparativamente mais baixa nos indivíduos mais velhos do que a observada
pós-infecção natural, a maioria dos participantes manifestou algum tipo de
defesa pós-vacina (94% para as mulheres e 83% nos homens com 55 anos ou mais).
Para Kalil, é possível que as pessoas nesta faixa etária que já receberam as duas doses da Coronavac no início do ano estejam correndo hoje um risco maior de ter doença grave, especialmente frente a novas variantes, como a delta.
ESTRATÉGIA
A Coronavac, desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac e produzida,
no Brasil, pelo Instituto Butantan, é formulada a partir de vírus inativado.
Ela foi a principal estratégia de imunização no país nos primeiros meses da
campanha nacional de vacinação. Assim, a maioria dos profissionais da linha de
frente e dos indivíduos com mais de 65 anos no país recebeu a Coronavac.
O imunologista destaca que as respostas imunológicas dos vacinados com
Coronavac foram menores que as dos convalescentes, mas também menores que a dos
indivíduos mais jovens que receberam o mesmo fármaco.
Procurado, o Instituto Butantan respondeu ao estudo afirmando que é
sabido que "a resposta imune de defesa no organismo diminui com o avanço
da idade, sendo observado que qualquer vacina gera uma resposta imune menor em
pessoas mais idosas".
Segundo a nota do instituto, "isso não quer dizer que os mais
velhos não estejam protegidos contra a doença, mas sim, que o organismo
responde menos a um antígeno novo, uma característica que não se relaciona à
vacina em si, mas aos processos naturais do sistema imunológico".
Outras vacinas contra a Covid-19 desenvolvidas até agora tiveram em
geral uma resposta celular elevada, como ocorreu com as vacinas de mRNA
(Pfizer/BioNTech e Moderna), e taxas de anticorpos neutralizantes semelhantes
em pessoas abaixo e acima de 55 anos (AstraZeneca).
Os autores concluem que uma dose de reforço heteróloga, isto é, de outro
fabricante, pode beneficiar aquelas pessoas com 55 anos ou mais que receberam
as duas doses da Coronavac, aumentando a resposta imune.
O estudo é o primeiro a calcular a imunogenicidade conferida pela
Coronavac em pessoas dessa faixa etária. Durante a pesquisa de fase 3 da vacina
conduzida no Brasil, apenas 5% dos 12.396 voluntários tinham 60 anos ou mais e
metade deles recebeu placebo.
Quando concedeu autorização de uso emergencial ao imunizante, a Anvisa
(Agência Nacional de Vigilância Sanitária) solicitou ao Butantan dados
adicionais de imunogenicidade nesse grupo, fixando um prazo de 30 dias (até 28
de fevereiro).
O instituto, porém, solicitou extensão do prazo até 30 de abril, quando
entregou os dados. A última reunião entre Butantan e Anvisa para discutir os
dados de imunogenicidade foi em 27 de julho e não há data definida para a
apresentação dos resultados.
Na última semana, a Sinovac divulgou dois estudos que mostram queda da taxa de anticorpos após seis meses tanto em pessoas abaixo de 60 anos como em indivíduos mais velhos. Os mesmos estudos avaliaram a segurança e imunogenicidade uma terceira dose da Coronavac, o que aumenta em até sete vezes a quantidade de anticorpos no sangue.
Fonte:
Diario do Nordeste
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