Parece que a honestidade de Jair Messias Bolsonaro é bastante questionável, sim. O presidente, que teve como slogan de campanha a corrupção zero, foi pego no pulo ao ter o sigilo de suas viagens na Câmara abertas na Justiça. O presidente é acusado de "farrear" com dinheiro público, como mostra o livro "Nas asas da mamata: A história secreta da farra das passagens aéreas no Congresso Nacional", dos jornalistas Eduardo Militão, repórter do UOL, Eumano Silva, Lúcio Lambranho e Edson Sardinha, que será lançado na semana que vem pela editora Matrix.
Além da lua de mel, Michelle teve 17 viagens pagas, assim como os filhos de Bolsonaro. Todos os tickets aéreos foram pagos com dinheiro público.
Na época, o deputado federal, a mulher e os quatros filhos, além da ex-esposa Ana Cristina Siqueira Valle usaram a cota parlamentar para comprar passagens. | Marcelo Camargo/Arquivo/Ag. Brasil
A cerimônia religiosa de casamento na época, entre o então deputado federal Jair Bolsonaro e a assessora parlamentar Michelle de Paula Firmo Ferreira, aconteceu em março de 2013. Porém, o casal se uniu no civil anos antes, em 28 de novembro de 2007, em um cartório da Avenida W3 Sul. E no dia seguinte, Bolsonaro e Michelle viajaram para Foz do Iguaçu (PR) em um voo da Gol, com escala em Curitiba, capital do Paraná.
As passagens aéreas custaram R$
1.729,24 e foram pagas com verba da cota parlamentar. Para viajar, Bolsonaro
informou à Câmara sobre sua ausência pelo período de sete dias e justificou
internamente, para evitar corte de salário, como "núpcias". O
presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia (PT-SP), foi quem o
liberou na época, após um processo administrativo interno.
Essa e outras revelações são contado no livro
"Nas asas da mamata: A história secreta da farra das passagens aéreas no
Congresso Nacional". Os dados utilizados na obra são das próprias
companhias aéreas que foram obrigadas a ceder as informações em processos na
Justiça Federal. Além de Jair Bolsonaro, outros parlamentares são citados no
livro, que possui 312 páginas.
Segundo o site UOL, o primeiro capítulo conta
sobre a viagem de lua de mel do presidente e sua esposa. Além disso, nesse
mesmo trecho, a obra revela ainda como a primeira-dama, seus parentes e os
quatro filhos homens de Bolsonaro também usaram passagens compradas com a cota
parlamentar para visitar locais turísticos ou passear, até mesmo sem a presença
de Jair Bolsonaro.
Procurado pelos autores, o presidente da
República não explicou as viagens e o uso da verba pública para pagar os
bilhetes.
Michelle teve 17 viagens
pagas pela Câmara
Antes mesmo do casamento, a partir de agosto
de 2007, Michelle fez uso de passagens compradas com a cota parlamentar de
Bolsonaro. Segundo aponta o livro, a maioria tinha origem em Brasília e o
destino era o Rio de Janeiro, base eleitoral do presidente e onde ele tinha
residência fixa.
Ainda de acordo com os autores, as companhias
TAM, Varig e Gol forneceram ao Judiciário registros de, pelo menos, 17 viagens
de Michele, todas pagas pela Câmara entre agosto de 2007 e fevereiro de 2009.
Nessas ocasiões, a agora primeira-dama estava com Bolsonaro, uma das filhas ou
parentes.
No total, esses voos dela e de seus parentes
custaram aos cofres públicos R$ 18 mil, em valores da época.
Viagens ao Nordeste e
Florianópolis
Ainda segundo o livro "Nas asas da
mamata", o presidente também usou verba de sua cota parlamentar para pagar
viagens para seus quatro filhos, Flávio, Carlos, Eduardo e Jair Renan.
Os autores apontam que, entre 2007 e 2008, os
três filhos mais velhos fizeram cinco viagens entre Rio, São Paulo e Brasília
com passagens da cota da Câmara. Nessa época, Carlos já era vereador no Rio de
Janeiro e Flávio, deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj).
Em 21 de janeiro de 2008, Flávio e Carlos
foram a Salvador, na Bahia, em pleno verão. Os dois estavam acompanhados de uma
mulher não identificada pelos autores. O custo da viagem? R$ 3.903,72.
O livro aponta também, viagens de Flávio a
Florianópolis e Porto Alegre, além de outro passeio dele com o irmão Carlos
para Fortaleza, no Ceará. Em todos os casos, as passagens foram pagas com
dinheiro da cota de Bolsonaro na Câmara.
Quem também apareceu na lista de passageiros
com bilhetes emitidos em 2007 foi Jair Renan, o "04", e sua mãe, Ana
Cristina Siqueira Valle, segunda mulher do presidente. Leonardo Rodrigues de
Jesus, o Léo índio, também usufruiu de passagens entre o Rio e Brasília. Também
na mesma época.
Processos do Judiciário
"Acho que tem conexão com o podcast A
vida secreta de Jair porque tanto as rachadinhas, ou seja, o desvio de dinheiro
dos funcionários é peculato tanto quanto o uso indevido da passagem aérea e
isso não é só a gente que acha. Procuradores da República viram isso e
formularam denúncias", explicou Lúcio Lambranho, um dos autores do livro.
Bolsonaro não é o único caso do tipo no Congresso
Nacional, mas para saber maiores detalhes é preciso ler todo o livro que será
liberado após o lançamento.
Os autores começaram a investigar o caso em
2008, numa série de reportagens premiada que saiu no site Congresso em Foco a
partir do ano seguinte. O livro, no entanto, começou a ser escrito em 2014.
Eles também prometem revelar no livro como se deram os processos de
arquivamento de todas as denúncias feitas no Judiciário sobre o tema.
"O livro mostra como grupos relevantes
da classe política lidam com o dinheiro público e da relação deles com o
público e privado. O resultado é um envolvimento suprapartidário, inclui
políticos de esquerda, direita e centro", explicou Eduardo Militão, um dos
autores.
"Acreditamos que quem vai ler a obra vai
poder perceber como as coisas funcionam no Brasil desde o século XIX, como
funcionaram no século XX e como, aparentemente, ainda funcionam. Vai se
verificar o que a gente chama de mamata. Uma relação, que se não é criminosa,
é, no mínimo, indevida de apropriação privada do patrimônio público",
completou Militão.
Nas reportagens do Congresso em Foco, os
jornalistas já apontavam que 1.881 voos internacionais foram pagos por
parlamentares com verba de suas cotas para Miami e Nova York, nos Estados
Unidos. Paris, na França. Londres, na Inglaterra. Milão e Roma, na Itália.
Bariloche e Buenos Aires, na Argentina. Madri, na Espanha. Frankfurt, na
Alemanha. Santiago, no Chile. Montevidéu, no Uruguai. Caracas, na Venezuela.
Essas viagens foram feitas por 261 deputados e, em maioria, eles estavam
acompanhados de familiares.
Em 2016, mais de 400 políticos foram
denunciados pelo uso da verba da cota parlamentar para pagar passagens para
destinos turísticos e também para terceiros, entre 2007 e 2008. Ao todo, 558
parlamentares ou ex-parlamentares acabaram implicados no caso.
O Ministério Público Federal chegou a cobrar
R$ 50 milhões em ressarcimentos e multas. No entanto, segundo os autores, a
maioria dos processos acabou arquivada, incluindo o que existia contra Jair
Bolsonaro.
A maioria dos parlamentares não devolveu o
dinheiro usado.
Com informações UOL
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