O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quarta-feira (14) confirmar a decisão do ministro Luís Roberto Barroso de mandar o Senado instalar a CPI da Covid.
Os magistrados decidiram, por dez votos a um, confirmar a decisão do ministro Luís Roberto Barroso para que seja instalada a comissão para apurar as ações de combate ao coronavírus realizada pelo Governo Federal.
Os magistrados decidiram confirmar a decisão do ministro Luis Roberto Barroso. | Agência Brasil
Por dez votos a um, os ministros concordaram que a
minoria da Casa Legislativa conseguiu apoio de um terço dos parlamentares e,
por isso, tem o direito de abrir uma comissão para apurar ações e possíveis
omissões do governo federal na condução da crise sanitária decorrente da
pandemia do coronavírus.
Os magistrados entenderam que estão presentes os
três requisitos exigidos pela Constituição para criação de CPI, que são, além
da assinatura de ao menos 27 senadores, a indicação de fato determinado a ser
investigado e a definição de prazo de duração.
Apenas o ministro Marco Aurélio divergiu. Ele
defendeu que decisões tomadas pelo relator de maneira individual em mandados de
segurança não precisam ser analisadas pelo plenário.
O magistrado não votou em relação ao mérito da
ordem de instalação da CPI e apenas afirmou que não concorda com a forma do
julgamento.
"O que ocorre se o plenário admitir hoje o
instituto do referendo da liminar em mandado de segurança? Estará a impetração
esvaziada. Estará inobservada a própria lei que rege essa interpretação, no que
sinaliza que a atribuição para implemento de tutela de urgência ou para
indeferir a tutela é unicamente do relator", disse.
A decisão representa uma derrota para o presidente
Jair Bolsonaro (sem partido), que trabalhou para evitar a instalação da
comissão.
Após a ordem judicial de Barroso, porém, o chefe do
Executivo mobilizou sua base aliada e conseguiu ampliar o objeto da CPI para
que também apure os repasses do governo federal a estados e municípios, o que
dilui a pressão de uma investigação focada apenas no Palácio do Planalto.
O requerimento de criação da CPI foi lido na
terça-feira (13) pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
Em meio à pressão da base governista para tentar
minar a comissão, Pacheco decidiu unir dois requerimentos apresentados por
senadores, formando uma única comissão que, além de investigar a gestão do
presidente Bolsonaro, também tratará de repasses de verbas federais para
estados e municípios.
No julgamento desta quarta-feira, o STF deixou
claro que a decisão respeita a jurisprudência da corte que prevê decisão para
determinar a criação da comissão quando estão presentes os três requisitos
previstos na Constituição.
Os ministros afirmaram, porém, que a ordem do
Supremo não representa uma intromissão nos trabalhos do Legislativo. Isso quer
dizer que o Supremo não determinará data de instalação, composição do colegiado
nem cronograma de trabalho da CPI.
Não é a primeira vez que o STF determina a
instalação de CPIs a pedido da oposição. Em 2005, o Supremo mandou instaurar a
dos Bingos, em 2007, a do Apagão Aéreo, e, em 2014, a da Petrobras.
Barroso afirmou que a Constituição é expressa em
afirmar que não cabe juízo político do presidente das Casas Legislativas para
decidir sobre abertura ou não de uma CPI.
"Trata-se de garantia que decorre da cláusula
do Estado democrático de Direito e que viabiliza às minorias parlamentares o
exercício da oposição democrática. Tanto é assim que o quórum é de um terço dos
membros da Casa Legislativa, e não de maioria", afirmou.
A decisão de Barroso foi duramente criticada por
Bolsonaro, que acusou o ministro de atuar com viés político e disse que o
Supremo interfere nos demais Poderes.
Pacheco, que se elegeu para comandar o Senado com
apoio do governo, também criticou a decisão.
Ele qualificou a decisão do STF de equivocada e
disse que, neste momento, "com a gravidade que a pandemia nos exige união,
vai ser um ponto fora da curva".
Os ministros analisaram mandado de segurança
apresentado pelos senadores Jorge Kajuru (Cidadania-GO) e Alessandro Vieira
(Cidadania-SE). Eles haviam apresentado o pedido de instalação de CPI ao
presidente do Senado e, diante da resistência em acolher a solicitação,
acionaram o Supremo.
A crise política desencadeada com a decisão de
Barroso foi ampliada após Kajuru divulgar um diálogo que teve com Bolsonaro por
telefone em que o tema era o assunto entre os dois.
Na ligação, o presidente pressiona o senador para ampliar
o objeto da CPI e pede para o parlamentar também pedir ao Supremo que seja
determinada a abertura de impeachment contra ministro da corte no Senado.
Ao votar nesta quarta, Barroso afirmou que a
jurisprudência do Supremo é pacífica quanto a permitir aos parlamentares que
tenham proposto a criação de CPIs no Congresso Nacional recorreram à corte para
postular a sua instalação.
"Nas democracias, a Constituição
institucionaliza e limita o exercício do poder político. E, na maior parte dos
países, é a Suprema Corte ou o tribunal constitucional que interpreta
adequadamente esse limites", afirmou Barroso.
"Diversos países do mundo vivem recessão
democrática. Exemplos conhecidos são Hungria, Polônia, Turquia, Rússia,
Geórgia, Venezuela. Todos eles, sem exceção, assistiram processos de ataques e
esvaziamento de seus tribunais constitucionais. Quando a cidadania daqueles
países já era tarde. Reafirmar o papel das Supremas Cortes de proteger a
democracia e os direitos fundamentais é imprescindível ato de resistência
democrática."
O ministro disse que não há de criativo, original
ou inusitado na decisão liminar concedida por ele.
"Concedi à luz da doutrina. Quanto à
jurisprudência, o tema foi objeto de apreciação pelo STF em diversas ocasiões,
com a participação de componentes atuais do nosso plenário", afirmou.
Barroso citou precedentes do tribunal que
determinaram a instalação de comissões parlamentares de inquérito em governos
passados. E reafirmou o direito da minoria em fiscalizar o poder público,
sobretudo em relação à pandemia.
"A instalação de uma CPI não se submete a um
juízo discricionário seja do presidente da casa legislativa, seja do plenário
da casa legislativa. Não pode o órgão diretivo ou a maioria se opor a tal
requerimento por questões de conveniência ou de oportunidade políticas.
Atendidas exigências constitucionais, impõe-se a instalação da comissão
parlamentar de inquérito."
O relator disse que o papel do Supremo na defesa
dos direitos das minorias deve ser exercido com parcimônia.
"Como regra geral, decisões políticas devem
ser tomadas por quem tem voto. Todavia, neste mandado de segurança o que está
em jogo não são decisões políticas, mas o cumprimento da Constituição, e o que
se discute é o direito das minorias parlamentares de fiscalizarem o poder
público, no caso específico diante de uma pandemia que já consumiu 360 mil
vidas apenas no Brasil", disse Barroso.
"Não cabe ao Senado Federal dizer se vai
instalar ou quando vai funcionar, mas como vai proceder. Caberá ao Senado
definir se por videoconferência, se por modo presencial, ou por modo
semipresencial."
Antes do voto de Barroso, o subprocurador-geral da
República Humberto Jacques de Medeiros, representante da Procuradoria-Geral da
República no julgamento, defendeu a decisão do Supremo.
"Entende o Ministério Público que a liminar é
correta e coerente. As mudanças fáticas não justificam a alteração da
jurisprudência", disse Medeiros.
O subprocurador-geral afirmou que o Ministério
Público Federal avalia que não há litígio entre poderes da República,
"apenas a necessidade de aclararmos, de reiterarmos a jurisprudência dessa
corte mesmo na situação incomum em que se vive".
"O que demonstra que não há nenhum tipo de
tensão entre Poderes, mas apenas delimitação clara, reafirmação precisa da
vinculação do ato de instalação de uma CPI", disse Medeiros.
FOLHAPRESS
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