O TCU (Tribunal de Contas da
União) decidiu, nesta quarta-feira (1), enviar ao Ministério Público Federal
uma lista com os beneficiários que supostamente cometeram fraudes para receber
indevidamente o auxílio emergencial de R$ 600 do governo federal. Os auditores
identificaram pagamentos para aposentados, servidores e até mortos.
Diante das graves irregularidades, o ministro
relator do processo, Bruno Dantas, decidiu enviar os "casos mais
escandalosos" ao MPF (Ministério Público Federal) para que os
beneficiários sejam processados criminalmente. Há, por exemplo, aposentados da
Justiça Federal e do Banco Central na lista do socorro do governo com
aposentadorias de R$ 25 mil e R$ 50 mil por mês.
Caberá ao MPF investigar cada situação e,
eventualmente, processá-los criminalmente caso se confirme o dolo. "Essa
decisão se dirige apenas ao grupo de pessoas repugnantes, insensíveis e
desprovidas de senso de ética, empatia e solidariedade com os que
verdadeiramente dependem desses R$600 para comprar comida para si e para suas
famílias", disse à Folha de S.Paulo o ministro Bruno Dantas, relator do processo.
No julgamento, Dantas afirmou que a área
técnica responsável (Secretaria de Previdência) verificou a existência de
pagamentos a 17 mil pessoas que faleceram, 235 empresários com faturamento
elevado, servidores, dentre outros. Os números foram obtidos após cruzamento
com mais de 70 bases de dados disponíveis. O plenário acompanhou o voto do
relator, que também determinou aos ministérios envolvidos, particularmente o da
Cidadania, que conduza ações para o ressarcimento dos valores pagos
indevidamente.
Essa proposta não foi diferente daquela dada
em um outro processo envolvendo o Ministério da Defesa, que já recuperou R$ 16
milhões até meados de junho pagos indevidamente a 25 mil militares que
receberam a ajuda emergencial. Ainda faltam cerca de 28 mil oficiais a
devolverem os recursos aos cofres públicos.
Situação similar está em andamento com os
casos envolvendo pessoas de alta renda, parentes de empresários ou de
servidores que tiveram o nome aprovado pelo governo para a ajuda. A proposta de
Dantas é que escapem da devolução somente aqueles que comprovarem terem sido
alvo de fraudes ou que, ao contrário, tenham como demonstrar o direito ao
recurso.
Segundo o relatório da área técnica, os
valores pagos indevidamente podem chegar a R$ 1,3 bilhão caso não sejam interrompidos
imediatamente. Durante o julgamento, três ministros também protestaram sobre os
achados da área técnica, além do relator.
"A maior crise que a gente enfrenta é a
crise moral e esse caso mostra bem isso", disse o ministro Augusto
Sherman. O ministro Vital do Rêgo fez um breve apanhado de casos anteriores em
que houve auditoria na distribuição de terras a políticos pelo Incra e
pagamento de seguro defeso a empresários.
"Que Brasil de brasileiros que burlam é
esse? Quero crer que esse tipo de Brasil é o da minoria", disse o ministro
Vital do Rêgo. Na semana passada, a Justiça do Rio Grande do Sul tentou barrar
a veiculação pelo programa Fantástico, da TV Globo, de nomes de beneficiários
que receberam indevidamente a ajuda do governo. Produzida por uma afiliada da
emissora, a reportagem apresentava a comerciante gaúcha Ana Paula Brocco como
exemplo dos que não tinham direito ao auxílio. Ela foi à Justiça, mas a
decisão, considerada censura prévia, foi derrubada em recurso da emissora a
tempo da exibição.
O relatório do TCU será enviado ao Congresso
Nacional e à Casa Civil do Palácio do Planalto. O monitoramento do auxílio
emergencial é uma das medidas adotadas pelo TCU para verificar os gastos
públicos durante a pandemia. Segundo o tribunal, conforme informações
consolidadas de abril, foram pagos, somente no primeiro mês de vigência do
socorro do governo, R$ 35,8 bilhões a 50,2 milhões de beneficiários.
Em 2019, somente com o Bolsa Família, foram
gastos R$ 32,5 bilhões. Em maio, em maio de 2020, foram pagos R$ 41 bilhões a
58,5 milhões de beneficiários, considerando pagamentos da primeira e segunda
parcelas. Um desses relatórios de monitoramento já havia apontado que cerca de
8,1 milhões de pessoas poderiam ter recebido indevidamente o auxílio emergencial,
por erro de inclusão. Outros 2,3 milhões de pessoas poderiam ter tido o auxílio
emergencial negado indevidamente, por erro de exclusão.
Além dos problemas com os pagamentos, o TCU
também apontou "falta de diretriz" do governo nas despesas com saúde
por causa, principalmente, da inexistência de coordenação das ações federais
com a dos governadores.
Julio Wiziack/Folhapress
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