Quando a deputada federal Natália Bonavides, 31, nasceu, o PT já tinha
oito anos. No dia em que ela completou cinco meses de idade, o partido teve seu
primeiro grande êxito eleitoral, conquistando prefeituras de capitais como São
Paulo (SP), Porto Alegre (RS) e Vitória (ES).
Ricardo Stuckert |
A potiguar é a mais jovem entre os 53 deputados petistas. Além dela, há
apenas mais dois parlamentares nascidos depois da criação do partido, em 10 de
fevereiro de 1980.
Em comparação, o PSL, que fez uma bancada equivalente à do PT, tem 18
parlamentares nessa faixa etária.
Ao completar 40 anos na segunda-feira (10), o PT busca se reerguer de
seu período mais difícil, em que se sucederam Lava Jato, recessão, impeachment
de uma presidente e a prisão de seu maior líder.
Para isso, uma das tarefas mais urgentes, segundo lideranças do partido
ouvidas pela reportagem, é reconectar-se com setores que foram perdidos para a
direita, seja liberal ou conservadora. Entre eles, a juventude.
"O principal desafio do PT é fazer a reconexão com parcelas da
classe trabalhadora e da juventude que migraram para outro projeto político em
2018", afirma Bonavides.
A deputada seguiu um roteiro que sempre foi comum para jovens do
partido. Filha de petistas, subiu no palanque de Lula durante comício em seu
estado na campanha presidencial de 2002. "Tenho uma foto do lado dele bem
novinha, usando aparelho. Eu tinha 14 anos", lembra.
Depois, foi líder estudantil, trabalhou com movimentos populares,
elegeu-se vereadora e finalmente chegou a Brasília, na eleição de 2018.
Este percurso está se tornando mais raro. Segundo a Secretaria de
Organização do PT, o partido tem 137 mil filiados até os 30 anos, o que
representa apenas 8% do total dos que informaram sua idade nos registros da
legenda. Os maiores de 60 anos, em comparação, são 24% deste universo.
"A questão da renovação é dramática para nós. O PT é um partido que
envelheceu", afirma Gilberto Carvalho, 69, ex-chefe de gabinete de Luiz
Inácio Lula da Silva na Presidência e um dos quadros históricos do partido.
"À esquerda, o PSOL, conseguiu uma certa renovação. À direita, isso
aconteceu graças a investimentos feitos pelo [empresário Jorge Paulo] Lemann
que resultaram em lideranças como a [deputada] Tabata Amaral, além de grupos
como o MBL [Movimento Brasil Livre]", diz Carvalho.
Recuperar esse terreno, segundo ele, passa por encontrar um novo
discurso para transformações estruturais que ocorreram na sociedade desde que o
PT foi afastado da Presidência, há quatro anos.
Ele cita o crescimento das relações de trabalho informais, ocorrida após
a reforma trabalhista, e a chamada "uberização". "Não podemos
reproduzir cânones antigos. O mundo mudou, a sociedade mudou", afirma.
O que permanece imutável no partido é a deferência a Lula, e a defesa
permanente de sua candidatura presidencial.
Após um longo período de cerco político, em razão da Lava Jato e dos
escândalos que atingiram a figura de seu maior líder, o partido parece ter
readquirido alguma autoconfiança.
A Vaza Jato, a libertação do ex-presidente e os erros políticos do
governo de Jair Bolsonaro têm estimulado petistas a gritar "Lula
2022", apesar de todos os processos judiciais que ele enfrenta.
"Temos de estimular outras lideranças, mas nenhuma se igualou a
ele. Não temos outra figura sedutora da mesma forma que Lula. Defendo que seja
ele [o candidato], com certeza", diz Carvalho.
Na onda vermelha de 1988, o ex-bancário Olivio Dutra deu ao partido uma
de suas maiores vitórias, ao conquistar a Prefeitura de Porto Alegre. Depois,
foi governador do Rio Grande do Sul e ministro de Lula, de quem se mantém muito
próximo.
Fundador do partido, ele defende um autoexame intenso do PT para
reconhecer erros. Escândalos como Lava Jato e mensalão seriam resultado de uma
certa permissividade em práticas da legenda.
"Nesses 40 anos, o PT ficou muito parecido com outros partidos, ao
fazer da atividade política uma coisa pragmática, ao promover um toma lá da cá,
um é dando que se recebe, uma frouxura nas alianças", diz Dutra, 78.
Segundo ele, o partido tem que se reavaliar permanentemente. "É
preciso se instigar, reconhecer que o que fez não foi pouco, mas que também se
equivocou e errou em outras pontas", afirma.
Dutra, a exemplo de outras figuras emblemáticas do partido, segue
defendendo Lula, mas demonstra um certo incômodo com a personificação do PT na
figura de seu maior expoente.
"O partido não é o Lula. Se não fosse o partido, o Lula não
existiria. O partido não pode depender apenas de uma figura individual, por
mais que o respeitemos", afirma.
Desde que foi solto, em novembro do ano passado, o ex-presidente retomou
a atividade partidária com gosto. Tem participado inclusive de reuniões para as
quais nunca teve muita paciência, com encontros de diretórios estaduais.
Em São Paulo, entrou diretamente na articulação, até agora malsucedida,
de encontrar um candidato de consenso para disputar a prefeitura. Em sua sala
na sede do Instituto Lula, no bairro paulistano do Ipiranga, dá expediente
quase diário, recebendo lideranças de vários partidos.
Reservadamente, petistas sabem que a possibilidade de Lula ter condições
jurídicas de disputar a Presidência novamente é mínima. O ex-presidente já foi
condenado em dois processos e é réu em mais seis.
Caso esteja impossibilitado de concorrer, o nome do ex-prefeito Fernando
Haddad desponta novamente como favorito. Outra alternativa citada é o
governador da Bahia, Rui Costa. Apoio a um nome de outro partido, como sempre,
é algo praticamente descartado.
Presidente nacional do partido, reeleita em novembro para mais um
mandato de quatro anos, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), 54, diz que a
Lava Jato é uma ameaça constante contra o PT.
"A Lava Jato continua como uma espada na cabeça do PT, porque ele é
usada como instrumento político. Sempre se saca um inquérito, uma investigação.
Esse tipo de perseguição é muito forte", afirma.
Ela detecta, contudo, um certo arrefecimento na avaliação negativa que
as pessoas têm do partido, motivada pelo questionamento aos métodos usados pelo
atual ministro Sergio Moro (Justiça) quando era juiz federal em Curitiba.
"A visão sobre a Lava Jato e o PT é muito diferente hoje do que
tivemos em 2016 [ano do impeachment de Dilma Rousseff]. A Vaza Jato nos
ajudou", afirma ela, em referência à divulgação de diálogos entre Moro e
procuradores.
Para Gleisi, houve uma carga "descomunal" em cima do PT.
"Nenhum partido mereceu o processo de desconstrução que o PT sofreu. Qual
a conta do Lula no exterior? Do PSDB, tem", declara.
Esse novo ambiente, acredita ela, dá condições para que o partido retome
parte da força política que perdeu para o bolsonarismo.
"Essa perda é momentânea", diz Gleisi, para quem a sociedade
brasileira está sempre em disputa.
À acusação de que o PT se afastou de sua base histórica, Gleisi diz que
foi parte de um processo inevitável, em que dirigentes foram chamados a
contribuir com o governo.
"Houve uma transferência de quadros, para fazer frente ao desafio
de governar. De fato isso deixou o partido muito fragilizado", afirma.
O próximo passo no caminho do PT para tentar se recompor é a eleição
municipal de outubro. Como o resultado de 2016 foi desastroso, é quase
impossível o partido não crescer.
O possível fortalecimento de Bolsonaro, embalado pela relativa melhora
da economia, não assusta, afirma a presidente petista.
"Mesmo que o PIB cresça 2,5%, a vida do povo não vai melhorar.
Aumentou a pobreza, a fome voltou. Basta andar nas portas dos
supermercados", declara.
Fabio Zanini/Folhapress
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