As
luzes da cidade de Juazeiro do Norte, no Cariri do Ceará, se apagaram por 30
segundos, na noite do dia 1º de novembro de 1969, antes de 24 refletores
iluminarem a atração principal: a Estátua do Padre Cícero, na Colina do Horto.
Há exatos 50 anos, acontecia a inauguração do monumento de 27 metros, em evento
que reuniu, segundo os jornais da época, entre 100 e 200 mil pessoas. Hoje, a
escultura é o cartão-postal do município de 270 mil habitantes. Para muitos,
Juazeiro do Norte é o principal “milagre” do “padrinho”.
Anualmente
a estátua atrai, em média, 2,5 milhões de visitantes. Além de um importante
ponto turístico da região do Cariri, com bela visão de Juazeiro do Norte, de
cidades vizinhas e da Chapada do Araripe, a gigante imagem do sacerdote também
se tornou importante símbolo da fé romeira. É impossível pisar na terra do
Padre Cícero e não passar pelo Horto.
Com
esse grande número de visitantes, é natural que o local reúna diversos
comerciantes informais, como Severina Espírito Santo da Silva, natural de
Cuitegi (PB), que abandonou a roça há 17 anos para vender artigos religiosos ao
lado da escultura do sacerdote cearense. “A gente vive disso aqui. Mudar foi
melhor. Aqui é bom demais. Vou ficar aqui mesmo”, enfatiza.
Idealização
A
construção da estátua aconteceu por um acaso. Em 1967, ano em que assumiu a
Prefeitura de Juazeiro do Norte, o médico Mauro Sampaio mandou derrubar o
chamado “pé de tambor”, uma árvore de Timbaúba, para construir uma antena de
televisão. Porém, os devotos do Padre Cícero ficaram revoltados, pois, segundo
a tradição oral, a árvore era um dos locais de meditação e refúgio do
sacerdote.
Antes
disso, no final do século XIX, já com suas ordens religiosas suspensas após o
“Milagre da Hóstia” - controverso evento em que, ao dar eucaristia a uma fiel,
o pão consagrado por Padre Cícero teria se transformado em sangue na boca da
beata -, o aclamado santo popular já frequentava a Colina do Horto, antigamente
chamada de “Serra do Catolé”. Lá, fazia seu retiro espiritual e iniciou a
construção de uma igreja para Bom Jesus do Horto. O projeto foi abandonado em
1904 por ordens da Diocese de Fortaleza. A edificação, de forma natural, foi
ruindo até ser demolida no final da década de 1930. “Então, já havia sido
profanado outro símbolo de fé”, conta a historiadora e pesquisadora Amanda
Teixeira.
Ao
prefeito Mauro Sampaio sugeriram fazer um busto do fundador de Juazeiro do
Norte. O médico, em conversa com outros amigos, imaginou que uma estátua, que
poderia ser vista por todas as pessoas da cidade, seria o ideal e traria uma
perspectiva de turismo para a cidade. “Ele queria fugir da ideia de romaria, de
uma população muito pobre, que vinha a Juazeiro pedir a bênção e realizar
práticas diversas de fé. Esse discurso era muito forte, dizendo até que a
estrutura do horto ia contar com praça, playground, várias atrações. Seria um
complexo turístico”, explica Amanda Teixeira.
Construção
O
jornalista e escritor Aldemir Sobreira, falecido há três anos, narrava que, a
princípio, tentaram encontrar um escultor em Fortaleza, mas a procura foi em
vão. Outro dia, o próprio Aldemir e Mauro Sampaio visitaram uma exposição de
artes plásticas na Faculdade de Filosofia do Crato — atual Universidade
Regional do Cariri —, onde conheceram, por acaso, o artista plástico
pernambucano Armando Lacerda, que topou fazer o projeto da Estátua.
A
princípio, o monumento teria sete metros de altura, fora a base. Porém, Armando
optou por construir uma estátua de 12 metros. Um galpão foi montado no armazém
de uma antiga usina de algodão, na esquina das ruas São Paulo e São Francisco.
Durante a modelagem, o próprio escultor decidiu ser mais ousado e aumentou o
tamanho da estátua para 17 metros. Os cálculos pelos engenheiros foram feitos e
a proposta foi aprovada.
De
forma artesanal, a estátua do Padre Cícero foi construída em dois anos. O
aposentado Severino Antônio Santana, 76, morador da Rua do Horto, que na época
tinha entre 15 e 16 anos, foi um dos serventes que trabalhou no projeto.
"Foi feita a base, o pé e, depois, a estátua”, explica. Um molde de gesso
foi produzido no ateliê, no Centro da cidade, para formar as peças de concreto,
que, como um quebra-cabeças, foram elevadas por uma espécie de carretel,
puxadas por alguns cabos de aço. A cabeça do santo foi encaixada por último.
Orgulhoso
de ter participado da obra, Severino enxerga com admiração e olhos marejados
para o monumento. “Trabalhar para o Padre Cícero, eu fico até emocionado”,
confessa. Devoto do “padrinho”, o aposentado acredita que se não fosse o
sacerdote, sua família existiria. “Desde minha avó, que vinha para cá a pé, da
Paraíba. Ele é santo”, resume.
Festa
Para
celebrar a data, o cantor Fagner realiza um show na Praça do Romeiro, em frente
à Basílica de Nossa Senhora das Dores, a partir das 21 horas. Completam a programação
o músico caririense Fábio Carneirinho e a cantora Ana Ruth, juazeirense que
ficou em segundo no lugar no programa The Voice Brasil. Na Colina do Horto, aos
pés da estátua, o cantor Jota Farias anima o público. Um show pirotécnico
colore o céu da cidade às 22 horas.
Por Antonio
Rodrigues, G1
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