Pelo menos 229 toneladas de ouro com indícios de ilegalidade foram comercializadas no Brasil entre 2015 e 2020. O montante representa praticamente metade de toda a produção nacional e foi extraído de dentro da floresta amazônica por garimpeiros ilegais, um total de 54%, retirado principalmente do Mato Grosso (26%) e do Pará (24%). A prática ilegal acontece principalmente nas terras indígenas. A crise humanitária da população Yanomami, que vive em uma das regiões mais afetadas por garimpos ilegais, e revelada no último sábado (21), reforçou a necessidade de combate a essas invasões e ao comércio ilegal de ouro no país.
Atividade tem afetado diretamente a população indígena que vive nas áreas atingidas, no Mato Grosso e no Pará. Governo Lula promete agir.
Mais da metade do ouro comercializado de 2015 a 2020 no Brasil ocorreu de maneira irregular. | CHICO BATATA / GREENPEACE |
“O Brasil
precisa erradicar o garimpo ilegal”, defendeu o diretor-presidente do Ibram -
Mineração do Brasil, Raul Jungmann, ontem, ao entregar ao secretário especial
da Receita Federal, Robinson Sakiyama Barreirinhas, um ofício solicitando que a
autarquia implante a obrigatoriedade de emissão de notas fiscais eletrônicas,
em substituição às elaboradas em papel – inclusive manuscritas –, que ainda são
utilizadas para registrar operações de comercialização de ouro do garimpo.
“Esta é uma medida necessária para coibir, via rastreabilidade, a produção
ilegal e a comercialização de ouro dessa fonte”, enfatizou Jungmann.
URGÊNCIA
Ao final da
reunião, Robinson Sakiyama disse que tratará o assunto internamente com
celeridade e priorizando as ações necessárias e que levará a questão ao
ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
O encontro
ocorreu em Brasília, na sede da Receita. Jungmann foi acompanhado do diretor de
Relações Institucionais do Ibram, Rinaldo Mancin; do ex-secretário da Receita
Federal e consultor do Instituto para temas tributários, Jorge Rachid; e do
diretor executivo do Instituto Escolhas, Sergio Leitão.
O Escolhas
elaborou o maior diagnóstico conhecido no país sobre os caminhos do ouro
ilegal, o estudo “Raio X do ouro: mais de 200 toneladas podem ser ilegais”, que
mostra que 1/3 desse ouro foi comercializado por apenas cinco Distribuidoras de
Títulos e Valores Mobiliários, as DTVMs, que compram de garimpos na Amazônia.
As DTVMs são
as únicas que podem comprar o ouro dos garimpos e são empresas do setor
financeiro autorizadas a funcionar pelo Banco Central. “Elas deveriam ser as
principais interessadas em garantir a procedência do metal”, revela o estudo
produzido pelo Instituto Escolhas.
Entre 2015 e
2020, essas corretoras movimentaram um terço de todo o volume com indícios de
ilegalidade encontrado no estudo, ou 79 toneladas. “Isso significa que 87% de
suas operações são duvidosas”, revela o levantamento. Três dessas corretoras –
a F.D’Gold, a Carol e a Ourominas – já fazem parte de ações judiciais recentes
movidas pelo Ministério Público Federal no Pará (MPF-PA) e lideram a
comercialização de ouro ilegal no Pará.
Pelo menos 570 crianças já
morreram por desnutrição
O Ibram -
Mineração do Brasil já havia solicitado apoio do Banco Central e da Comissão de
Valores Mobiliários para que fosse intensificada a fiscalização sobre as
Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários que negociam ouro com o
garimpo. O Ibram também solicitou apoio do Ministério das Relações Exteriores
para que seja exigida de compradores estrangeiros de ouro do Brasil a
certificação de origem do minério e ainda apoio da Polícia Federal para o uso
de tecnologias inovadoras que façam o rastreamento desse minério.
“A situação
trágica envolvendo o povo yanomami é uma das consequências diretas das ações
perpetradas há muitos anos por quadrilhas de criminosos organizados na
Amazônia. Entre os quais, os que se autointitulam “garimpeiros” (atividade
regulamentada em lei), mas que, na realidade, praticam o garimpo ilegal”,
revela o texto distribuído pelo Ibram.
INVASORES
Os casos de
garimpos ilegais no Pará em terras indígenas envolvem áreas protegidas como a
TI Kayabi (MT/PA) e os Parques Nacionais da Amazônia (PA), como a Serra do
Pardo, localizada na região da Terra do Meio, com área de mais de 445 mil
hectares, abrangendo os municípios de Altamira e São Félix do Xingu, que sofre
frequentes invasões por parte de garimpeiros ilegais, além da região das
Montanhas do Tumucumaquen, na divisa entre o Pará e Amapá.
A crise
humanitária causada pelo garimpo ilegal na Terra Indígena (TI) Yanomami chocou
o país e o mundo: sem conseguirem precisar o número de mortes devido à
atividade ilegal no território Yanomami, a estimativa é de que pelo menos 570
crianças morreram de desnutrição nos últimos quatro anos, segundo a ministra
dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, com base num levantamento do Ministério
da Saúde.
A situação do
povo Yanomami não era desconhecida do governo federal. Durante a gestão de Jair
Bolsonaro, lideranças indígenas como Dario Kopenawa Yanomami, da Associação Hutukara
que foi até Brasília expor a situação e pedir a expulsão dos garimpeiros. Mas
nada foi feito nos últimos quatro anos
Autor:Luiza Mello de Brasília
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