Um paciente brasileiro com complicações no olho causada por varíola dos macacos melhorou após ser tratado com o antiviral tecovirimat. Além da reposta positiva ao medicamento, trata-se do primeiro registro de um tipo de inflamação nesse órgão relacionada a varíola dos macacos.
Tratamento foi utilizado em paciente de clínica em São Paulo; são raras as complicações nesse órgão.
SP registrou conjuntivite associada à varíola dos macacos. | (Crédito: Freepik) |
O achado consta de artigo publicado nesta quinta-feira (22) na revista
Jama, que analisou o caso de um rapaz de 27 anos atendido na Clínica de Olhos
Dr. Moacir Cunha, do Grupo Fleury na capital paulista.
A inoculação do vírus nos olhos ocorre quando a
pessoa infectada toca em alguma lesão (um dos principais sintomas da doença),
onde há alta carga viral, e leva a mão à região ocular. Um desfecho já
reportado é conjuntivite: um levantamento concluiu que 23% de pacientes infectados
pelo vírus da varíola dos macacos entre 2010 e 2013 no Congo apresentaram a
complicação. Cenários mais extremos também ocorrem, como pessoas que perderam a
visão.
No surto atual, considerado uma emergência de saúde pública pela OMS
(Organização Mundial da Saúde), casos assim são raros. Um dos poucos exemplos é
o do brasileiro que teve sua condição clínica reportada no novo artigo da Jama.
Assinado por pesquisadores brasileiros, a publicação diz que o paciente é um
homem de 27 anos que foi à Clínica de Olhos Dr. Moacir Cunha, do Grupo Fleury,
em agosto, com o olho esquerdo vermelho, apresentando sensibilidade à luz, dor,
coceira e baixa visão.
O diagnóstico do rapaz foi de ceratite e uveíte: a
primeira é uma inflamação da córnea do olho, enquanto a segunda é também uma
inflamação, mas intraocular, ou seja, no interior do olho.
O paciente reportou teste positivo para a varíola
dos macacos, com a primeira lesão comum à varíola dos macacos observada 24 dias
antes de procurar o atendimento oftalmológico –a doença já estava quase
totalmente superada quando ele procurou ajuda para seu problema no olho.
No início, uma das explicações para seu quadro ocular seria herpes
causando a ceratite. Optou-se pelo uso de colírio e valaciclovir, medicamento
utilizado no tratamento de herpes. Apesar disso, o paciente continuava
piorando. Outro ponto era que exames foram feitos no olho do paciente para
herpes, sífilis e varíola dos macacos. Os resultados para as duas primeiras
doenças foram negativos, enquanto o da terceira foi positivo.
O homem não apresentava sinais de recuperação no
olho, mas não era isso que acontecia com sintomas da varíola dos macacos. As
poucas lesões da doença que ele ainda tinha, após sete dias do atendimento
oftalmológico, deixaram de registrar o DNA do vírus.
Então, os médicos suspenderem o valaciclovir e
iniciaram a terapia com o tecovirimat logo que o remédio passou a estar
disponível no Brasil. A partir do terceiro dia do uso do antiviral, o paciente
passou a melhorar e, dias depois, recuperou-se das inflamações no olho.
Os resultados são promissores, porém não finais. "Baseado nesse
caso, a gente não tem condição de dizer que foi o antiviral que curou o
paciente", diz Luciana Peixoto Finamor, oftalmologista da Clínica de Olhos
Dr. Moacir Cunha, na capital paulista, e uma das autoras do artigo.
Alguns pontos, no entanto, tendem a indicar isso. O
principal é o fato de o paciente começar a ter sinais de melhora logo depois da
utilização do antiviral. Segundo Finamor, foram cerca de dois meses com o exame
do olho registrando o vírus, situação que só foi mudar com o remédio.
"Depois do tratamento, ele 'negativou'. Então
é mais uma ferramenta que mostra que o antiviral fez a diferença para o
controle da doença [inflamação no olho]", afirma.
Finamor ainda conta que, além deste caso, cerca de 8 a 10 brasileiros já
apresentaram complicações oculares por varíola dos macacos e tiveram tratamento
com o tecovirimat. Casos parecidos também foram documentados nos Estados
Unidos. Ela menciona um estudo do CDC (Centro de Controle de Doenças dos EUA)
que observou resultados positivos do antiviral para cinco pacientes com
complicações oculares associadas à infecção viral. Nenhum deles, no entanto,
apresentou a uveíte.
Isso porque, segundo Finamor, o brasileiro foi o
primeiro paciente com uveíte associada à varíola dos macacos. O ineditismo gera
preocupação, já que a complicação é caracterizada como intraocular.
"O olho, teoricamente, é uma contiguidade do
sistema nervoso central. Então, se a gente tem presença de inflamação
relacionada a essa doença dentro do olho, isso poderia ser uma oportunidade
para se ter uma disseminação para o sistema nervoso central", conclui.
Autor: Samuel Fernandes / Folhapress
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