17 de janeiro de 2021, a enfermeira Mônica Calazans foi a primeira a receber vacina contra a covid 19 no Brasil, fora de estudos clínicos. De lá para cá foram mais de 300 milhões de doses aplicadas.
O momento em que o Brasil completa um ano do início da vacinação contra a Covid é bem parecido com o de janeiro de 2021.
Primeira criança vacinada, Davi, 8, é da etnia xavante e faz tratamento médico em SP | reprodução |
O momento em que o Brasil completa um ano do
início da vacinação contra a Covid é bem parecido com o de janeiro de 2021: o
governo Bolsonaro faz falas contra os imunizantes, começa uma nova fase da
campanha vacinal e mais uma variante provoca uma onda de infecções que se
alastra rapidamente pelo país.
A aplicação da Coronavac ocorreu no Centro de
Convenções do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo, na capital paulista.
Quase um ano depois, nesta sexta (14), foi a
vez de o indígena Davi Seremramiwe Xavante, 8, ser a primeira criança menor de
12 anos vacinada contra a Covid no Brasil. Mais uma vez, no Hospital das
Clínicas.
Antes da vacinação de Calazans, em 2021,
Bolsonaro questionava a segurança dos imunizantes. Chegou a fazer chacota
quando testes da Coronavac foram paralisados pelo suicídio de um voluntário.
"Mas pressa para a vacina não se
justifica, porque você mexe com a vida das pessoas", disse Bolsonaro, em
entrevista ao próprio filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), em dezembro
de 2020. Na mesma ocasião, afirmou que a pandemia estava chegando ao fim.
Enquanto outros países já começavam a
vacinação, não havia sinais de início no Brasil –o governo federal não assinara
contrato para fornecimento dos imunizantes da Pfizer-BioNTech. "Para que
essa ansiedade, essa angústia?", afirmou sobre o início da vacinação o
então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello.
Uma demora semelhante e constantes falas se
opondo à vacinação infantil contra a Covid marcaram o fim de 2021 e o início de
2022. O governo chegou a abrir uma consulta pública e planejar exigência de
pedido médico para vacinar crianças de 5 a 11 anos.
"A pressa é inimiga da perfeição.
Principal é a segurança", afirmou, em dezembro de 2021, Marcelo Queiroga,
ministro da Saúde, ao ser questionado sobre a possibilidade de antecipar a
vacinação infantil, com vacinas da Pfizer (imunizante com registro definitivo
na Anvisa), que já ocorria em segurança em outros países.
Renato Kfouri, pediatra, infectologista e
diretor da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), destaca que o ministro
não perde a chance de falar que só os pais que quiserem vão vacinar as crianças
contra a Covid.
"Nós temos um presidente antivacinista
que, sempre que pode, fala mal das vacinas", diz Kfouri. "O
lançamento da vacina nas crianças foi quase um pedido de desculpas por ter
colocado a vacina no calendário." Apesar de todas as falas negativas, a
vacinação no país foi muito bem recebida pela população, que, em vários
momentos, chegou a enfrentar filas para conseguir sua dose.
A demora para o início da vacinação, porém,
pode ter acarretado um custo de vidas, diz Raquel Stucchi, professora da
Unicamp e consultora da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia). "Com
vontade política e planejamento adequado, nós teríamos evitado milhares de
mortes, porque já teríamos a população vacinada antes e com maior
celeridade."
O ano de vacinação jogou mais luz sobre algo
que já era comprovado por estudos: as vacinas são seguras e eficazes para os
mais diversos grupos. "O objetivo delas foi diminuir mortalidade e
hospitalização. Todas elas cumpriram muito bem esse papel", afirma
Stucchi.
Por aqui, até mesmo o impacto da delta
–altamente transmissível e que fez estragos em outras nações– foi relativamente
pouco sentido, apesar da presença maciça da variante no país. Segundo Stucchi,
a explosão anterior da variante gama no Brasil, que levou a médias de mortes
superiores a 3.000 por dia e a um amplo contato prévio com a doença na
população, é uma das explicações para o impacto menor da delta. A outra é o
grande contingente de pessoas com vacinação recente e, consequentemente, maior
proteção.
Esse, por sinal, é um dos aprendizados do
Brasil e do mundo no último ano. As vacinas têm uma diminuição da proteção com
o passar do tempo, diz Kfouri. Além disso, observou-se uma maior efetividade de
vacinas de RNA mensageiro, como é o caso da Pfizer, para populações mais
frágeis, como pessoas imunocomprometidas e idosos. O déjà-vu no Brasil se
completa com uma nova variante. A chegada da ômicron fez explodir as infecções.
A nova variante deixou claro algo que muito
se pesquisava e especulava sobre as vacinas disponíveis: elas, sem dúvida, dificultam
a transmissão, mas não necessariamente conseguem impedi-la. "Ela é
transmissível demais e não poupa vacinados", diz Kfouri. Para o segundo
ano vacinal contra Covid, o diretor SBIm espera que, possivelmente, todos
acabem tendo que tomar alguma dose a mais.
Ao mesmo tempo, vacinas atualizadas com cepas
dominantes do Sars-CoV-2 e ainda mais efetivas para conter a transmissão devem
surgir. Afinal, a política de aplicação constante de doses de reforço não é
viável, como vem apontando a OMS (Organização Mundial da Saúde). Para que as
campanhas vacinais tenham sucesso de forma ainda mais robusta dentro dos
países, entidades e especialistas têm alertado que é necessária uma
distribuição mais igualitária dos imunizantes pelo mundo.
( Folhapress )
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