Ambas as propostas são consideradas retrocessos por especialistas e têm pouco apoio no Senado. 'Distritão' reduz diversidade de candidatos; coligações incentivam 'partidos de aluguel'.
O plenário da Câmara dos Deputados rejeitou
nesta quarta-feira (11) o chamado "distritão" e aprovou a volta das
coligações partidárias nas eleições proporcionais (para deputados federais,
estaduais e vereadores).
Os dois dispositivos estavam contidos em
uma proposta de emenda à Constituição (PEC), aprovada em primeiro turno, que promove uma minirreforma nas regras
eleitorais.
Por modificar a Constituição, a proposta
precisa ser aprovada em dois turnos na Câmara e no Senado para entrar em vigor.
Para valer nas eleições de 2022, as mudanças precisam ser promulgadas até o
início de outubro.
A implementação do "distritão"
implicaria eleger somente os candidatos mais votados – sem proporcionalidade
dos votos recebidos pelas legendas – em um modelo que enfraquece os partidos e
favorece candidaturas personalistas.
A formação de coligações permite a união
de partidos em um único bloco para a disputa das eleições proporcionais. A
mecânica favorece os chamados "partidos de aluguel", que não defendem
ideologia específica e tendem a negociar apoios na base do "toma lá, dá
cá".
As coligações foram proibidas em 2017 e
também são consideradas um retrocesso pelos especialistas, mas foi classificado
por deputados como uma "redução de danos" no acordo, firmado entre
todos os partidos, que levou à rejeição do "distritão".
Nesta quinta (12), os deputados voltam a
se reunir em plenário para votar destaques ao texto – trechos para os quais
houve pedido de análise em separado. Se houver acordo, a Casa pode quebrar os
prazos regimentais para votar o segundo turno e enviar o texto ao Senado.
Relatora da PEC, a deputada Renata Abreu
(Podemos-SP) informou que o texto aprovado inclui medidas como:
·
diminuição
do número de assinaturas para apresentação de projeto de lei de iniciativa
popular
·
data
de posse do presidente da República e dos governadores, respectivamente, para
os dias 5 e 6 de janeiro
·
proibição
da realização de eleições nas vésperas de feriado nacional
O presidente do Senado,
Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e outros senadores já disseram que o texto, quando
chegar ao Senado, deverá enfrentar resistência.
Votação 'surpresa'
A votação da PEC foi
anunciada em plenário pelo presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL),
sob protesto de líderes da oposição. Inicialmente, o cronograma previa que o
texto entrasse em pauta nesta quinta (12).
O texto que saiu da comissão especial
propunha duas alternativas incompatíveis entre si: a adoção do "distritão" e
a volta das coligações partidárias.
A implementação do "distritão"
implicaria eleger os candidatos mais votados – sem qualquer redistribuição dos
votos. A formação de coligações, por outro lado, serve justamente para orientar
o remanejamento da votação entre os partidos que firmaram acordo.
Por isso, os dois sistemas não poderiam
funcionar de modo simultâneo: um invalidaria o outro.
Os dois modelos foram incluídos na mesma
PEC porque, na comissão especial que analisou o texto, os deputados não
chegaram a acordo.
Volta das coligações
A PEC aprovada em
primeiro turno prevê a retomada das coligações partidárias
– que foram descartadas em 2017, em uma emenda à
Constituição, após amplo debate no Congresso.
A volta das coligações favorece a proliferação das
chamadas "legendas de aluguel" – partidos sem
ideologia, que se reúnem em torno de figurões políticos para barganhar apoio no
parlamento.
O Brasil tem, hoje, 33 partidos formalmente
registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O
número vem crescendo desde a redemocratização e, hoje, dificulta a chamada
"governabilidade" do país – o governo precisa negociar com cada vez
mais lideranças, o que favorece o chamado "toma lá, dá cá".
Deputados afirmam que a reforma de 2017,
que pôs fim às coligações nas eleições proporcionais (de deputados e
vereadores), fortaleceu a democracia.
"Com a volta das coligações, nós
vamos ter mais partidos do que os 36 que já temos. E se nós mantivermos o fim
da coligação, vão sobrar 10 a 12 partidos no país, não precisa mais do que
isso. Porque isso dá identidade para os partidos, fortalece a democracia. A
volta da coligação é para que muitos se salvem, porque sem coligação a porta é
estreita e poucos podem passar", diz o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS).
'Distritão' derrotado
Os deputados rejeitaram, na votação em
plenário, o chamado "distritão" – modelo que elege como deputados
federais os candidatos mais votados em cada estado.
A descrição parece simples mas, segundo
especialistas, a aprovação representaria um retrocesso em relação ao modelo
proporcional adotado hoje em dia.
Pelo modelo atual, as 513 cadeiras da
Câmara dos Deputados são distribuídas de forma proporcional aos votos obtidos
por cada partido – e então, destinadas aos candidatos mais bem votados de cada
legenda. Com isso, todo voto é contabilizado e os partidos têm maior incentivo
para oferecer uma diversidade de candidatos nas urnas.
O "distritão" incluído na PEC:
·
favoreceria
apenas os candidatos que são mais famosos e/ou têm mais dinheiro;
·
dificultaria,
com isso, a renovação dos representantes na Câmara;
·
descartaria
os votos dos candidatos menos votados, assim como os votos que
"ultrapassassem" o mínimo necessário para conseguir uma vaga;
·
enfraqueceria
os partidos políticos ao concentrar os cálculos nos candidatos,
individualmente;
·
prejudicaria
a pluralidade das candidaturas e enfraquece candidatos que representam
minorias.
·
Essa
proposta já tinha sido rejeitada duas vezes
pelo plenário da Câmara, em 2015 e em 2017. Ou
seja: mesmo favorecendo quem já está eleito, o modelo enfrenta ampla oposição
no parlamento.
"É extremamente ruim para a
democracia, o distritão, uma vez que ele concentra poder, favorece os já
eleitos, não favorece renovação. Favorece quem utiliza mais fundo eleitoral
para chegar aqui, e quem tem muito voto", diz o deputado Vinicius Poit
(Novo-SP).
"Totalmente ruim. A democracia tem
que se organizar através dos partidos, de ideias, de conceitos, de ideologias.
É assim que se faz”, afirma o deputado Carlos Zaratinni (PT-SP).
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