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Notícias falsas na pandemia reacendem urgência por fiscalização e punição


A pandemia do novo coronavírus voltou a jogar luz sobre a prática de disseminação de informações fraudulentas ou deturpadas, habitualmente chamadas de "fake news", no Brasil e no mundo. Na internet, circulam "notícias bombásticas" que prometem remédios milagrosos e apontam supostas tramas de governos para "mascarar a verdade da população". Barrar os impactos negativos das notícias falsas tem sido desafio de empresas e diferentes poderes públicos, punindo quem as promove e educando as pessoas sobre o que é consumido e compartilhado como informação.


Na última semana, a agência de checagem de informações do Governo do Ceará, chamada Antifake, desmentiu mais de uma publicação em redes sociais, com dados deturpados, que tentavam levar a população a acreditar que o número de mortes por doenças em 2020 era menor que o do ano passado, logo, haveria, por trás das notícias sobre a pandemia, uma tentativa de "enganar as pessoas". Compartilhado pelo presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido), o conteúdo foi ocultado pelo Instagram após ser classificada como falso.

"Esse movimento, quando não fala a verdade, confunde a população, espalha pânico e reduz a resolutividade das ações governamentais", pontua o secretário da Saúde do Ceará, Dr. Cabeto, sobre o impacto da desinformação no atual cenário de crise.

Se as "fake news" trouxeram prejuízos ao pleito eleitoral em 2018, ainda hoje investigados no Congresso Nacional, a inserção delas no campo da ciência tem trazido riscos inclusive à saúde da população. No Ceará, a Antifake já checou mais de 15 informações inverídicas ou distorcidas sobre a pandemia de Covid-19.

Fiscalização

No fim de abril, a Assembleia Legislativa aprovou projeto de lei que prevê multa de R$ 200 a R$ 2,2 mil a quem disseminar notícia mentirosa relacionada à pandemia com a intenção de prejudicar alguém. Segue pendente, no entanto, a regulamentação da norma, que está na Procuradoria-Geral do Estado.

O texto deve ser aperfeiçoado, após questionamentos de entidades de imprensa no que diz respeito a possíveis ameaças à liberdade de expressão. O professor da FGV-Direito de São Paulo e pesquisador do Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação da mesma instituição, Guilherme Klafke, ressalta que, quando se trata das tentativas de regulação da questão pelos governos, o primeiro e principal obstáculo é a fiscalização, em especial pelo volume de informações que circulam na internet e pela dificuldade de acessá-las, como no caso do WhatsApp.

"A última dificuldade dessas leis é fixar um critério para aplicá-las. Esse critério pode ser a veracidade do fato, saber se é verdadeiro ou não. Com a incerteza da ciência, e a ciência por definição pode ter certezas provisórias, é difícil saber sobre a veracidade. Cloroquina funciona ou não funciona? Tem estudo falando que funciona, tem estudo falando que não funciona. Não vou punir as pessoas com base na veracidade ou não. Vou punir com base na intenção. Elas têm a intenção de causar caos, incerteza, desacreditar a imprensa, desacreditar grupos políticos, causar ofensas?", ressalta Klafle, pontuando desafios em se comprovar tais intenções. No caso do Ceará, a multa só deve ser aplicada caso seja provada a divulgação de fake news de má-fé.

Regulação

Além da regulação pelos órgãos públicos, o pesquisador pontua ainda medidas autorregulatórias das redes sociais, como a que bloqueou a exibição do conteúdo inverídico compartilhado pelo presidente no Instagram; a necessidade de educar a população e, principalmente, a importância de se descobrir a indústria que está por trás da produção de informações inverídicas.

"A gente não deve falar 'fake news'. A gente deve falar 'notícia fraudulenta', porque são mensagens criadas por pessoas para gerar desinformação e que só têm o formato de notícia, mas não têm o conteúdo de notícia. Ela busca a fraude, desinformar, criar o caos", frisa Klafke.

No Ceará, além do episódio que envolveu Bolsonaro, outras informações deturpadas foram veiculadas inclusive por políticos com mandatos. "Os deputados federais, os estaduais, estão na escala da sociedade dos mais responsáveis, representam o poder político há muitos anos. Tudo o que acontece tem uma escala hierárquica de responsabilidade", afirma o secretário Dr. Cabeto, ao defender que o Governo do Estado tem buscado "romper com uma política que não agrega".

Klafke destaca que a transparência dos governos é fundamental no combate às notícias falsas. "Um dos fatores que alimentam a notícia fraudulenta é a falta de informação. Quando não se diz quantos leitos estão ocupados, quanto foi gasto para combater a doença, quando não digo (Governo) o que quero fazer pela população vulnerável, permito que várias narrativas lutem entre si", alerta.

Média de 80 denúncias diárias no Ceará

Em meio à pandemia do novo coronavírus, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) cunhou o termo "desinfodemia" para chamar atenção ao surgimento de uma segunda mazela: a "desinformação básica sobre a doença de Covid-19". No Ceará, a situação se reflete tanto nas recentes ações criadas para conter a desinformação como no fluxo de cerca de 80 denúncias diárias que a agência de checagem do Governo do Estado já recebe em menos de um mês de atuação.

Segundo a Secretaria da Casa Civil do Ceará, antes mesmo da criação da Agência Antifake, os canais de comunicação eram acionados pela população por e-mail ou redes sociais para o esclarecimento de dúvidas.

"Temos, aproximadamente, 80 denúncias diárias, das quais três viram matéria por dia, em média. Os fatos são analisados mediante a quantidade de vezes em que são denunciados pela população. A partir deste momento, o grupo de jornalistas entra em contato com os técnicos das pastas para prestar o esclarecimento e checar se a informação procede ou não. Em ambos os casos, a matéria sempre vai além da mera constatação de fake ou não, mostrando as fontes e o nome do especialista que ancora a informação", afirma, em nota, a Casa Civil.

O Ministério da Saúde também lançou página direcionada a desmentir boatos relacionados à Covid-19, como orientações do órgãos que nunca foram dadas, anúncios de vacinas, formas de prevenção que não funcionam e alegações sobre o vírus, como o fato de ele morrer em temperaturas partir de 26º .

Entre as orientações estão duvidar de fontes desconhecidas, buscar orientações nos sites oficiais das autoridades de área, como a Organização Mundial de Saúde (OMS), a Organização Pan-Americana da Saúde, o Ministério da Saúde e as secretarias municipais e estaduais e evitar repassar informações sem certeza.

No Brasil, o ilícito relacionado a um conteúdo falso só existe na legislação eleitoral, mas a difusão dessas mensagens pode ser punida também com base nos ilícitos de calúnia e difamação, além de danos morais.


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