A informação
foi confirmada pelo economista Marcos Cintra, responsável pela área tributária
no grupo coordenado por Paulo Guedes, indicado para ministro da Economia. Nesta
sexta-feira, em um post no Facebook, Bolsonaro desautorizou "quaisquer
informações prestadas junto à imprensa por qualquer grupo intitulado 'equipe de
Bolsonaro' especulando sobre os mais variados assuntos, tais como CPMF,
previdência, etc" .
A ideia de
tributar movimentações financeiras foi revelada pelo jornal “Folha de S. Paulo”
ainda no primeiro turno e causou uma crise na campanha de Bolsonaro, devido à
impopularidade do “imposto do cheque”. Na ocasião, o então candidato negou a
criação de impostos. Depois do episódio, Guedes cancelou encontros e a campanha
não tocou mais no assunto. É a primeira vez desde as eleições que um integrante
da equipe confirma que a ideia está na mesa e detalha suas condições.
Impacto para
informais
Na primeira
versão do plano, apresentada em setembro, a ideia era criar um imposto único sobre
movimentações financeiras, que substituiria vários tributos federais, como IPI,
PIS e Cofins. Agora, a estratégia é implantar a ideia aos poucos, substituindo,
num primeiro momento, apenas a contribuição previdenciária patronal.
Segundo
Cintra, a alíquota do novo tributo seria de 0,4% a 0,45%, em cada operação. Ou
seja, numa transferência bancária, as duas partes seriam descontadas. Por
exemplo, ao transferir dinheiro para outra pessoa, há um desconto de 0,4% a
0,45%. Quando o dinheiro entra na conta do favorecido, há um novo desconto na
mesma alíquota. Na prática, a alíquota total da transação, portanto, ficaria
entre 0,8% e 0,9%.
Em
contrapartida, as empresas deixariam de recolher os 20% sobre a folha de
pagamento. Nos cálculos do economista, esse sistema faria frente à arrecadação
da contribuição sobre folha, que ficou em cerca de R$ 275 bilhões, segundo o
mais recente Balanço Geral da União, de 2017.
O objetivo
do economista, que defende esse modelo há 30 anos, é que a mudança gere mais
empregos. Cintra afirma que a tributação sobre folha de pagamento impede a
formalização no país — hoje, pouco mais de 30% dos empregados têm carteira
assinada.
— A
tributação sobre a folha é uma das mais injustas e regressivas (que aumenta a
desigualdade) que se pode imaginar. Estou propondo a total desoneração da
folha. No momento que se propõe isso, estimula emprego. O principal motivo da
reforma tributária é causar um choque de emprego — afirma o economista.
O novo
tributo substituiria apenas a contribuição patronal. O desconto no contracheque
do empregado seria mantido. Hoje, trabalhadores recolhem 8%, 9% ou 11%, de
acordo com a faixa salarial.
Para
compensar a perda dos trabalhadores com o novo imposto seria criado um sistema
de reembolso. Assim, as empresas pagariam, junto com o salário, um adicional
calculado sobre o salário bruto, a partir da alíquota do novo imposto. Por
exemplo, um empregado que recebe R$ 3 mil teria um pagamento adicional de R$
27, equivalente a 0,9% do salário, considerando que seja essa a alíquota
definida.
Trabalhadores
informais não teriam essa compensação, já que não contribuem para a
Previdência. Esses trabalhadores, no entanto, continuariam a recolher o
imposto, caso façam uma movimentação financeira.
— Quem está
na informalidade não teria essa proteção legal. Mas a ideia é que mais pessoas
estejam no mercado formal — afirma.
Segundo
Cintra, além de incentivar a contratação formal, a ideia do grupo também é
garantir uma fonte mais segura de arrecadação para o atual sistema de
Previdência. Ele explica que a medida não resolve o problema do déficit no
sistema de aposentadorias, mas permite que ele seja financiado por uma fonte
menos instável, que não é afetada, por exemplo, pela queda do número de trabalhadores
formais.
A proposta é
o principal ponto em que o desenho de reforma tributária se relaciona com os
planos para a reforma da Previdência, considerada a pauta econômica mais
urgente, pelo efeito que tem nas contas públicas. Em agosto, em entrevista
ao GLOBO, Paulo Guedes chegou a afirmar que uma das formas de
ajudar a lidar com o déficit bilionário do regime seria aumentar a base de
incidência de contribuição, sem especificar como isso seria feito.
Uma das
propostas de reforma da Previdência à disposição da equipe de Bolsonaro é a
elaborada por um grupo de especialistas coordenado pelo ex-presidente do Banco
Central Arminio Fraga e o economista Paulo Tafner. O plano foi detalhado ontem
e prevê que a seguridade social pode ter novas fontes de financiamento.
Questão de
quórum
Segundo
Marcos Cintra, ainda não há uma definição sobre se esse plano será posto em
prática nesses moldes exatamente. Ele destaca, no entanto, que a medida poderia
ser tomada já no primeiro momento do governo, que assume em janeiro.
Ele acredita
que, para passar a CPMF previdenciária seria necessária apenas uma lei
complementar. Hoje, é uma lei complementar (a lei 8.212) que prevê a
contribuição previdenciária sobre folha. O economista argumenta que a
Constituição Federal já prevê, no artigo 195, que a seguridade social será
financiada por “toda a sociedade”, o que abriria espaço para que a medida fosse
à frente sem necessidade de uma emenda constitucional. Os detalhes jurídicos,
no entanto, ainda não estão completamente definidos.
O quórum
para aprovar uma lei complementar é de maioria absoluta nas duas casas do
Congresso, ou seja, 257 deputados e 41 senadores. A votação em dois turnos é
necessária apenas na Câmara. Para passar uma emenda constitucional, são
necessários 308 votos de deputados e 49 de senadores, com dois turnos em cada
Casa.
Procurado
para comentar os planos detalhados por Cintra, Paulo Guedes não retornou as
ligações e mensagens. Quando a ideia surgiu na campanha pela primeira vez, o
economista reforçou o discurso de Cintra de que o tributo não tem paralelo com
a CPMF. Ele não negou, no entanto, que a proposta estivesse em estudo.
A reforma
tributária seria o primeiro passo de um pacote mais amplo. Em uma proposta que
chegou a ser divulgada no primeiro turno das eleições, a ideia seria criar um
tributo que chegaria a uma alíquota de 2,6% para substituir vários tributos
federais de uma só vez. Esse modelo disputa com a proposta de criar um imposto
sobre valor agregado (IVA), defendido pelo economista Bernard Appy, que
reuniria em um único tributo cinco impostos.
Em outra frente,
a reforma tributária de Bolsonaro prevê a criação de uma alíquota única para o
Imposto de Renda, de 15% a 20%.
Fonte: O
Globo.
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