não mexer

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A antecipação das eleições diretas seria ainda mais nebulosa que a crise política atual

O crescimento da democracia brasileira se dará pela confirmação das suas instituições, preservação das regras do jogo e estabilidade da Constituição.

Crise econômica e instabilidade política. Gosto da expressão "o barco Brasil balança, as águas são turbulentas, todos se seguram, do empresário ao pedreiro, do prefeito ao presidente, da professora à médica, dos investidores aos proletários".

E assim já foi 2014, 2015, 2016 e, agora, 2017. Uma luz no fim do túnel pode ser uma nova eleição direta para presidente, com um novo mandatário "empoderado" pelo voto popular. Porém, creio que isto acontecerá somente em 2018, dentro do tempo previsto. Por isso, águas calmas ainda demoram a chegar.

Hoje, a Constituição prevê eleições diretas a cada quatro anos, com direito a uma reeleição. Em 1988, na aprovação pela Assembleia Nacional Constituinte (lembra, Dr. Ulisses, Constituição cidadã!), não era assim. A eleição era direta e o mandato único de cinco anos. Em 1994, uma emenda constitucional reduziu o mandato para quatro anos. Em 1997, no primeiro governo de FHC, instalou-se a reeleição. Em resumo, hoje a regra é um mandato oito anos com um "recall" no meio.

E as exceções? Se, por impeachment, renúncia ou condenação criminal ocorre a vacância do cargo, vamos ler o manual para ver como proceder. O artigo 81 da Constituição prevê novas eleições se o cargo de presidente ficar vago nos dois primeiros anos. Já foi – 2015 e 2016. A presidente eleita em 2014 saiu por impedimento, o vice-presidente foi empossado como presidente e, se sair agora em 2017, não haverá eleição direta.

A previsão constitucional expõe que "§ 1º Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei".

A regra já estava prevista na outra Constituição democrática – de 1946. Por isso, podemos dizer que é da tradição brasileira que haja a eleição direta se ocorrer a vacância nos dois primeiros anos de mandato, e a eleição indireta se vier nos dois últimos anos de mandato.
O que desorganizou o ambiente foi a reeleição aprovada em 1997. Alguém eleito agora, de forma direta ou indireta, estará certamente em situação privilegiada para uma reeleição em 2018. Isto certamente mexe com o equilíbrio de forças no Parlamento, na sociedade e dentre os agentes políticos.

Outro ponto. Como seriam as eleições indiretas? Primeiro, não é uma eleição propriamente dita. São um pouco mais de 600 votos que elegerão um nome consensualmente articulado. E não há nenhum problema nisso. A maioria parlamentar fará a escolha de um nome que já sai com um patamar de apoio necessário a preservar a governabilidade.

Mas as regras jurídicas dessa eleição indireta são um ambiente opaco. Recentemente, não se pensou nesta questão e por isso não há norma aprovada após a Constituição de 1988. Há uma lei editada para eleição do Presidente Castello Branco, em 1964, que foi utilizada até a eleição do Presidente Tancredo Neves, em 1985.

Ela é insuficiente perante a atual Constituição e o STF deverá ser chamado para complementá-la, dando-lhe ares democráticos. Deverá superar dúvidas como: o candidato necessitará ter filiação partidária? Como se dará a desincompatibilização dos candidatos em cargos públicos? Como será a campanha e a publicidade? Quem presidirá a eleição? O voto será nominal e aberto ou não? E por aí vai.

Por outro lado, piorando a interlocução do Governo com o Parlamento e a sociedade, poderíamos ter eleições diretas já? Há duas propostas de emenda constitucional para eleições diretas. Uma tramita no Senado e prevê a reforma do artigo 81 para estabelecer que haverá eleição indireta somente com a vacância no último ano. E uma tramitando na Câmara, prevendo a eleição direta com vacância antes dos últimos seis meses.

A proposta da Câmara possui um problema. Se aprovada, haverá coincidência de calendários eleitorais e estaremos com duas campanhas simultâneas nas ruas. Exemplifico: se a vacância ocorrer em maio de 2018 (a mais de seis meses do fim do mandato), serão convocadas eleições diretas em agosto para um presidente com mandato "tampão" até o fim de dezembro de 2018. E, simultaneamente, haverá outra campanha para voto em outubro de 2018 para o mandato regular. No mundo real, não dá!

No mundo das intenções, fala-se ainda em antecipação do calendário geral das eleições, alteração dos mandatos para cinco anos ou, até mesmo, reinserção do parlamentarismo. Todas as iniciativas dependem de emenda constitucional, com prazos regimentais em cada casa do Parlamento e duas votações com aprovação por maioria qualificada.

Elas não irão avançar. Não há clima político para aprovação de emendas constitucionais neste momento de turbulência política e crise econômica. E nem deveríamos pensar que há. O crescimento da democracia brasileira se dará pela confirmação das suas instituições, preservação das regras do jogo e estabilidade da Constituição. Esta é a regra e ponto.

Fonte: Huffpost Brasil 

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